quinta-feira, 13 de maio de 2010

As pátrias de Kafka



Franz Kafka (1883-1924) nasceu no antigo Império Austro-Húngaro em Praga. Cresceu sob as influências das culturas judaica, tcheca e alemã, tanto que escreveu seus livros em alemão. Em “O Desaparecido ou Amerika”, romance inacabado escrito entre 1912 e 1914, o escritor recria os Estados Unidos sem nunca ter saído da Europa. Kafka morreu em Klosterneuburg na Áustria, vítima de tuberculose.
            Formado em direito e trabalhando em uma companhia de seguros, Kafka teve uma vida monótona, burocrática e breve. Mas a sensibilidade desse homem o permitiu ser um cidadão do mundo em seus livros. Um dos autores que melhor traduziu a difícil vida do homem moderno nas grandes cidades.
            A partir de 10 de abril é a vez de Franz Kafka desembarcar em São Paulo. A Casa das Rosas vai abrigar o “Território Kafka”. Em cada cômodo, umas séries de atividades vão explorar as diversas faces e fases desse autor considerado por vezes tão incômodo e verdadeiro.
            A curadora da exposição, a bacharel em artes cênicas Solange Akierman, conta que o projeto surgiu a partir da descoberta de uma frase histórica atribuída a Kafka ao mirar a Praça da Cidade Velha de Praga e perceber a proximidade de três lugares que seu dedo delineava (escola, faculdade, emprego). Ele disse: “Esse pequeno círculo contém toda a minha vida”.  “Ora, se numa cidade como Praga especificamente a Praça da Cidade Velha há três lugares que contém toda a vida de Kafka por que não transportar esse mesmo círculo para uma outra cidade, São Paulo? Por isso foram escolhidos na Casa das Rosas três cômodos e em cada um serão feitas várias atividades que abordem as diversas faces e fases de Kafka. É o círculo paulista de Praga”, fala.
            Outro marco para homenagear Kafka é que em 2010 uma obra do autor, “O Processo”, um dos mais importantes livros da literatura universal, completa 85 anos de sua primeira edição. A primeira edição foi em 1925, um ano após a morte do autor. Um dado curioso a esse respeito é que um dos poucos exemplares dessa histórica edição encontra-se aqui no Brasil, trazida da Europa pelo ensaísta Otto Maria Carpeaux que chegou a conhecer Kafka e foi o primeiro que escreveu sobre ele no país. Atualmente esse exemplar encontra-se no acervo da Biblioteca Mário de Andrade.
As faces 
            A exposição Território Kafka é dividida entre a mostra de edições especiais de obras do autor tcheco, presentes na biblioteca do poeta Haroldo de Campos; da leitura de alguns trechos da obra “Carta ao pai”, na qual o público é convidado a participar; da exibição de registros audiovisuais de espetáculos teatrais da Cia. Borelli de Dança, inspirados na obra de Kafka; uma série de encontros que terão como base as formulações iniciais do texto “Esperando por Kafka”, de Vilém Flusser, para um possível estudo cênico das obras; e de uma mesa redonda para discutir o autor.
            O debate sobre Kafka está marcado para 22 de abril. A mesa reunirá a escritora Jeanette Rozsas, autora do romance biográfico “Kafka e a marca do corvo”; o escritor Juliano G. Pessanha, autor do livro “Instabilidade perpétua”; o professor Enrique Mandelbaum, autor do livro “Kafka: um judaísmo na ponte do impossível”; e o psicólogo e professor de Mitologia, Guilherme Kwasinski. A professora de literatura Luana Chnaiderman fará a mediação.
            Na exposição ‘“Da Bibliocasa” estarão disponíveis edições em alemão e a obra mais antiga nessa língua data de 1958 (“Der Prozess”)”. O acervo Haroldo de Campos possui 28 títulos relacionados diretamente a Franz Kafka.
Para Solange os livros de Kafka continuam muito ligados com nossa realidade atual, tanto que já é lugar comum empregar o adjetivo “kafkiano’ quando nos vemos envolvidos em situações de impotência diante de um poder maior, burocrático e impessoal que nos controla e nos impede de agir em direção a uma solução desejável, transformando todos os nossos esforços num padrão de iniciativas inúteis. “Kafka dizia de Praga algo que pode muito bem ser aplicado a São Paulo. Ele dizia: Praga não nos largará… esta mãezinha tem garras”, destaca.
Um de seus personagens mais conhecidos é Gregor Samsa, de “Metamorfose”. Ele é o homem transformado em uma barata dentro de uma realidade opressora e burocrática. Gregor reproduz a sensação do homem que virou o inseto insignificante das cidades.

O que é a Casa das Rosas
Localizado no número 37 da Avenida Paulista, o casarão foi projetado pelo escritório do arquiteto Francisco de Paula Ramos de Azevedo pouco antes de sua morte, tendo a construção terminada em 1935. A casa abrigaria a residência de uma de suas filhas. O imóvel foi habitado até 1986, quando sofreu desapropriação pelo governo do estado de São Paulo.
Casa das Rosas
Em 1991 foi então inaugurado um espaço cultural batizado de "Casa das Rosas". Recebeu esse nome pois possuía um dos maiores e mais belos jardins de rosas da cidade. A partir de 2004, a Casa se tornou o Espaço Haroldo de Campos de Poesia e Literatura e passou a ser administrada pelo professor e poeta Frederico Barbosa.
A Casa recebeu a doação do acervo completo de livros e também alguns objetos pessoais do poeta Haroldo de Campos.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Consumo da base popular ultrapassa o da classe alta


A estabilidade e a trajetória de crescimento da economia nacional finalmente estão levando milhões de brasileiros para o mercado de consumo.

A expectativa para 2010 é de que o consumo popular já ultrapasse  o das classes altas.  É o que mostra o estudo Tendências da Maioria, realizado pelo Data Popular com 2.093 entrevistados em todo o Brasil.

De acordo com a pesquisa, as classes A e B devem consumir neste ano um total de R$ 545,6 bilhões. Já para as classes C e  D, o número esperado é de  R$ 808,8 bilhões. Se for incluída a classe E (R$ 25 bilhões), o total de consumo popular chega a R$ 833,8 bilhões.

O Data Popular é um instituto de pesquisa voltado para as classes C e D e E. Seu sócio-diretor, Renato Meirelles, afirma que o grande destaque para 2010 deve ser a classe D, que reúne cerca de 70 milhões de pessoas com renda de 1 a 3 salários mínimos (R$ 510 a R$ 1.530).

Com R$ 381 bilhões para gastar em 2010, a expectativa é de que a massa de renda da classe D ultrapasse a da classe B ainda este ano – as 20 milhões de pessoa da faixa B, com renda entre 10 e 20 salários mínimos (R$ 5,1 mil a R$ 10,2 mil), deve ter para gastar, neste ano, um total de R$ 329,5 bilhões. A estimativa de número de pessoas  por classes é do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), dados de 2009.

“A população da classe D ainda é maior que a das classes A e B juntas, o que já é um bom indicativo do potencial de consumo. Esta é a faixa social que representa a transição da baixa renda para uma vida melhor, pois absorve um grande número de brasileiros de saída da linha da pobreza e impulsiona o crescimento da classe média”, comenta Renato.

O Data Popular afirma que, neste ano, o consumo dos emergentes deve se direcionar para os bens duráveis, como TVs de plasma, computadores, geladeiras e automóveis, e para serviços como viagens aéreas e cursos.

Emprego e renda são as explicações
O economista e conselheiro do Corecon-SP (Conselho Regional de Economia), Pedro Afonso Gomes, analisa que a estabilização de preços, sem dúvida, foi um fator importante para aumentar o arco dos consumidores potenciais – mas, no caso brasileiro, não foi o suficiente. “Até o início de 2003, o nível de emprego e da atividade econômica reduziu-se significativamente em relação ao período pré-Real, com o encerramento das atividades de muitas empresas. Nos últimos sete anos, houve uma elevação significativa e sustentada do emprego e da renda, criando postos formais e informais, o que permite ao empresariado pensar a longo prazo e aos trabalhadores adquirirem bens de consumo e duráveis antes inacessíveis”, comenta.

No caso dos itens essenciais, Pedro aponta que as classes C, D e E sempre os consumiram, mas produtos de qualidade ou preço inferiores. A entrada das classes C, D e E no mercado consumidor fez com que a maior escala produtiva permitisse menores preços para todos. “Nesse sentido, a elevação do padrão de vida dos mais pobres ajudou também a reduzir o custo de vida do menos pobres”, opina.


Preço e marca definem compra da classe popular
O operador de empilhadeira Hamilton Ramos da Cruz, 53 anos, é solteiro e mora sozinho. Como em tantas outras vezes,  nesta semana foi a um supermercado  para comprar seu almoço.

Pela praticidade, ele optou por uma lasanha pronta de R$ 6,90. “Na correria e porque moro sozinho, costumo fazer isso. Mas levo uma marca saborosa, já não pesa tanto no bolso”, conta.

Esse é o padrão de consumo que a pesquisa Data Popular aponta: a classe D tem aspirações de consumo realistas. São  famílias emergentes que fazem o orçamento render, buscam crédito e conseguem planejar a compra de bens duráveis, como eletrodomésticos, eletroeletrônicos e móveis, por exemplo. Essa mesma preocupação com o custo-benefício vale para os demais produtos, de alimentos a roupas, já que esse consumidor não pode errar na hora da compra.

O sócio-diretor do Data Popular, Renato Meirelles, afirma que, justamente por isso, o fator preço tem um peso importante, mas cada vez mais relativo “Ele já entende que as marcas podem garantir a qualidade do produto, mas continua orgulhoso de buscar promoções.”

A aposentada Maria Izabel Mafra, 65, é outro exemplo. Morando com dois filhos e um neto, ela  prefere fazer suas refeições, mas não abre mão das marcas. “Para mim, sai mais barato cozinhar e procuro  avaliar as marcas. Tem muito barato que sai caro, a comida não rende ou é péssima”, fala.

Para o Data Popular, alguns segmentos da indústria, do comércio e dos serviços já perceberam a importância do consumidor emergente – exemplo é o lançamento de  produtos e alimentos em embalagens familiares mais econômicas. No mesmo caminho, a rede Walmart anunciou neste ano o investimento de R$ 2,2 bilhões no Brasil para abrir 110 lojas, a maioria voltada para a classe popular, como a bandeira TodoDia.