domingo, 9 de dezembro de 2007

Eu adoraria te deixar excitado

A Day in the Life


I read the news today oh boy
About a lucky man who made the grade
And though the news was rather sad
Well I just had to laugh
I saw the photograph

He blew his mind out in a car
He didn't notice that the lights had changed
A crowd of people stood and stared
They'd seen his face before
Nobody was really sure if he was from the House of Lords.

I saw a film today oh boy
The English Army had just won the war
A crowd of people turned away
But I just had a look
Having read the book, I'd love to turn you on...

Woke up, fell out of bed,
Dragged a comb across my head
Found my way downstairs and drank a cup,
And looking up I noticed I was late.

Found my coat and grabbed my hat
Made the bus in seconds flat
Found my way upstairs and had a smoke,
and somebody spoke and I went into a dream

I read the news today oh boy
Four thousand holes in Blackburn, Lancashire
And though the holes were rather small
They had to count them all
Now they know how many holes it takes to fill the Albert Hall.
I'd love to turn you on.



Um Dia Na Vida

Eu li as notícias hoje, oh, garoto,
Sobre um homem de sorte que ganhou na Loteria
E apesar de as notícias serem bem tristes
Bem, eu tive apenas que rir...
Eu vi a fotografia...
Ele estourou sua cabeça em um carro
Ele não percebeu que o sinal tinha fechado
Uma multidão das pessoas ficou e olhou
Eles tinham visto seu rosto antes
Ninguém estava realmente certo se ele era do Senado
Eu vi um filme hoje, oh, garoto,
O exército inglês acabara de vencer a guerra
Uma multidão das pessoas foi embora
Mas eu apenas tive que olhar
Tendo lido o livro
Eu adoraria te deixar excitado...
Acordei, saí da cama
Penteei o meu cabelo
Desci as escadas e bebi um café
e observando, eu percebi que estava atrasado
Peguei meu casaco e coloquei meu chapéu
Peguei o ônibus rapidamente
Subi as escadas e fumei um cigarro
Alguém falou e eu entrei em um sonho
Ahhhhhhhhhhh
Eu ouvi as notícias hoje, oh, garoto,
Quatro mil buracos em Blackburn, Lancashire
E apesar de os buracos serem bem pequenos
Eles tiveram que contá-los um a um
Agora eles sabem quantos buracos são necessários para encher o Albert Hall
Eu adoraria te deixar excitado.


Ultima faixa do Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band. John Lennon tinha o começo e o fim de uma música, mas não sabia o que colocar no meio, então apenas gravou as duas partes e fez uma marcação de tempo para depois inserir o meio da canção. Para sinalizar as partes usou o som de um despertador.
Paul McCartney tinha uma música desconexa e apresentou ao colega para talvez preencher sua composição sem meio. Casou direitinho, inclusive com o som do despertador porque a última estrofe de Paul dizia "Wake up, fell out of bed..." (acorde, pule da cama...).
A inspiração para a letra de John Lennon é a sequência de acontecimentos que, segundo ele, havia lido recentemente no jornal londrino Daily Mail. A morte de carro foi inspirada na sofrida por Tara Browne, 25 anos, neto de Edward Cecil Guiness e herdeiro da famosa marca de cerveja Guinness.
Os 4.000 buracos, em uma notícia da existência dessa quantidade nas ruas de Blackburn, Lancashire. Sobre o filme visto, a referência próxima era a participação de John no filme "How I Won the War", em que o exército britânico vence a guerra. Baseado nestes acontecimentos, ele criou um universo onírico, com jogos de palavras, bem ao seu estilo de compor.
O verso "I'd love to turn you on" que finalizava ambas as partes da música atribuída a ele tinha conotação explícita com o uso de drogas: "Eu adoraria 'ligar/excitar' você". Naquela época, John Lennon estava no auge de suas experiências com o LSD.
A letra de Paul McCartney é mais pessoal. Refere-se a alguém que acorda, toma o café-da-manhã, sai atrasado para trabalhar, entra no ônibus e vai para a parte de cima (os ônibus britânicos têm dois andares). Então, fuma e entra em um sonho: "Found my way upstairs and had a smoke / Somebody spoke and I went into a dream" (Acomodei-me no andar de cima e acendi um cigarro, alguém falou e então entrei em um sono (transe)). Esta última parte da letra é uma referência explícita a uma "viagem" ocasionada pelo uso de droga, neste caso, a maconha.
Uma orquestra de 40 músicos participa da música para criar o efeito apoteótico no meio e no final.
Amigos e convidados especiais (Mick Jagger, Marianne Faithfull, Keith Richards, Donovan, Pattie Boyd e Michael Nesmith, entre outros), apito para cachorros e um trecho invertido (mensagens ocultas?) compõe o resto dessa incrível loucura.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Eu já sabia


É o mais amado e por isso mesmo o mais odiado. Ninguém ia facilitar para o Corinthians e o time é incapaz de vencer ou marcar muitos gols, portanto a segundona já veio faz tempo.
O imenso barrigão do Dualib foi empurrando vários vícios durante anos, tinha que dar merda.
Agora é aproveitar essa chance para mudar tudo.

segunda-feira, 26 de novembro de 2007

Abominável

Uma adolescente de 15 anos tenta furtar um mercado
Ela é pega e decide-se que tem que ir presa
Não há uma cela própria para ela, então é colocada junto com trinta presos homens
Ela passa pelo menos 15 dias nessas condições, sendo agredida e estuprada

Isso não aconteceu na Idade Média, num país africano ou em guerra declarada. Foi no Brasil (Abaetetuba/PA) e neste mês.
Se esse fosse um país sério, o ministro da Justiça e a presidente do Supremo Tribunal Federal cairiam e o Pará teria intervenção federal.
Algo vai acontecer?

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

a melhor banda do brasil (hoje)

disco novo da nação na praça. tecendo avaliações aprofundadas...

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

John Rambo rides again


Ele voltou!!!
É um cinema de aventura e dentro dele um subtipo: o de macho.
Stallone, Schwarzenegger, Charles Bronson, Chuck Norris, Vin Diesel, Steven Seagal, Dolph Lundgren, Van Damme e outros que não me lembro, fizeram filmes muito parecidos nas suas carreiras. A maioria horríveis e por isso até engraçados.
O fortão bondoso que mata todo mundo para salvar alguém. Não importa se existe outra forma de resolver o problema ou se o inimigo na verdade não é lá o capeta encarnado. O negócio é sentar o dedo, como diria o novo profeta dos machos, Capitão Nascimento.
Agora está chegando a vez John Rambo. A saga continua, mesmo com a cara de vovô dele. O filme se passa em Mianmar, no sudeste asiático. Na vida real é um dos piores lugares do mundo, em guerra civil há 60 anos. Mas esperamos que o filme seja bem maniqueísta, só com pancadaria e sangue, nada de mostrar o que as pessoas de lá pensam ou sofrem de verdade. Afinal Rambo tem que ser o herói da porrada.
Interessante que não começou assim. O primeiro Rambo, de 1982, é um filme ótimo. Conta a história de um soldado que voltou com neurose de guerra do Vietnã e não se adaptou mais à vida em sociedade. Uma história sem final feliz.

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

Lula lá... longe

Jogo muito caro
Permitir um terceiro mandato para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva seria muito temeroso. Além do equívoco mais fácil de ser percebido, qual seja, mudar as regras do jogo democrático no meio da partida para benefício próprio, modificar as leis eleitorais para uma segunda reeleição presidencial traria um desgaste político enorme para o país.
A prova disso aconteceu quando se tratou do mesmo assunto no Congresso em 1997. A aprovação da possibilidade de um novo mandato para os cargos do Executivo trouxe conseqüências graves para o então governo Fernando Henrique Cardoso. Como infelizmente acontece no Congresso em várias votações o fisiologismo e não o debate político e social guiou os parlamentares e membros do Executivo na aprovação da reeleição.
Naquele momento, inúmeras denúncias de troca de favores e cargos apareceram no noticiário nacional. Os deputados Ronivon Santiago e João Maia chegaram a renunciar para evitar um processo de cassação depois que conversas gravadas revelaram que haviam vendido seus votos em favor do governo.
Além disso, um terceiro mandato para o presidente Lula deveria vir atrelado a um projeto de governo mais sólido, o que até agora não é o caso já que ainda há muita dúvida se o país irá crescer com vigor num médio prazo. A alternância de poder, em qualquer setor da sociedade, é eficaz para aprimorar idéias e corrigir erros de um sistema.

terça-feira, 30 de outubro de 2007

Contribuições físicas e cosmológicas para filosofar no bar


Você já olhou para um céu noturno e se sentiu pequenininho?
Isso não é nada! A Terra é só um planeta no sistema solar. Júpiter, por exemplo, é muito maior.
Isso não é nada! O Sol é só uma estrela menor da Via Láctea. Dentro dessa galáxia existem outros milhões de estrelas e planetas.
Isso não é nada! A Via Láctea é só mais uma galáxia no meio de milhares de outras galáxias do Universo.
Isso não é nada! Existem infinitos universos paralelos!!!

Duvida? A física com a teoria das cordas mostra isso. Esse documentário legendado aí em cima feito pela BBC traz didaticamente essas idéias com os cientistas malucos explicando.
Eles querem chegar numa teoria única para compreender o Universo e sua criação e chegaram a conclusão que o Big Bang, que teria formado tudo o que conhecemos, foi provocado pelo choque de outros universos. E pior: isso deve continuar ocorrendo, ou seja, toda hora nascem universos!!!

domingo, 28 de outubro de 2007

Inocência e loucura


A minha impressão dos Beach Boys sempre foi apenas a de um grupo vocal com letras falando de surf e garotas e músicas bacaninhas com o que seria o príncipio da surf music.
Mas também já li e ouvi falar a respeito de um disco fantástico deles que é tido como uma lenda da música pop: "Pet Sounds" (1966). E, claro, outros mitos incríveis e tristes a respeito do líder e cérebro da banda: Brian Wilson.
Essa semana finalmente ouvi inteiro "Pet Sounds". É simplesmente perfeito!
É complexo musicalmente com arranjos belíssimos, riqueza instrumental com violinos, piano, oboé, guitarra de 12 cordas, entre outros, os vocais maravilhosos do grupo (além de Brian, também cantam seus irmãos Carl e Dennis Wilson, seu primo Mike Love e seu amigo de colégio Al Jardine) e letras falando do amor em suas várias formas.
Só esse tesouro lírico já vale o disco, mas a sua história de gravação é tão ou mais fantástica.
Brian Wilson é conhecido como um gênio da música. Ele é surdo de um ouvido e baixista e pianista brilhante. De modo semelhante à história de Mozart, o pai de Brian, Murry Wilson, educou com mão de ferro seu filho prodígio para ser um famoso músico e compositor.
O pai acabou virando empresário de Brian e do resto da banda, que nos anos 60 realmente se transformou num grupo de enorme sucesso no mundo pop tocando inocentes músicas sobre surf e garotas (quem não conhece Surfin' Safari?).
Mas Brian, com um eterno desejo de auto afirmação, na certa ensinado pelo pai, queria mais, queria revolucionar a música. Aí começam as lendas e verdades sobre ele.
Nessa época os Beatles a cada disco se superavam e reinventavam a música pop. Brian chegou a declarar sobre "Rubber Soul" (1965): "Percebi que cada canção tinha um grande acabamento e que todas eram muito estimulantes e resolvi trabalhar em novas canções. Eu me senti obrigado a competir com os Beatles."
Essa competição de Brian para muitos foi uma obsessão insana. Por conta disso, alega-se que ele entrou em depressão e pediu para abandonar uma turnê dos Beach Boys no Japão. Em 1965, seu único objetivo seria se isolar do estrelato, até certo ponto simplório e que ele mesmo e sua família havia construído, e criar algo totalmente novo e revolucionário.
Brian conseguiu essa alforria de seu pai e da gravadora e foi construir o mítico "Pet Sounds". Praticamente seu único parceiro foi o letrista Tony Asher. Juntos criaram lindas canções sobre o amor idealizado (Wouldn’t It be Nice), a imperfeição das das relações humanas (You Still Believe in Me), sobre o amadurecimento e os efeitos da solidão (That’s Not Me), sobre a perda da inocência, o amadurecimento e o fim do amor infantil, idealizado (Caroline No), entre outras maravilhosas. Foram gravadas duas músicas instrumentais também, Let’s Go Away for a While e Pet Sounds, de riqueza musical incrível.
Se era para competir com os Beatles, "Pet Sounds" realmente é um disco ainda mais maravilhoso do que "Rubber Soul".
George Martin, o lendário produtor dos Beatles, declarou: "Quando eu ouvi pela primeira vez, fiquei estupefato e comecei a perguntar o que era aquilo, pois era fantástico! E quando vamos ficando mais velho, a tendência é adotarmos uma postura cada vez mais comedida com as novidades. Sem ele, jamais teríamos feito Sgt. Pepper's."
Paul McCartney afirmou na época que uma das faixas de "Pet Sounds", God Only Knows, era a melhor canção popular já composta e a única que o fez chorar.
"Pet Sounds" foi um sucesso imediato e absoluto de crítica, mas não vendeu tão bem. E como todo mundo sabe, em 1967 os Beatles lançaram o grande "Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band". Diz mais uma lenda que Brian teria ficado arrasado com esse "contragolpe" do grupo britânico e entrado em depressão de vez por não conseguir criar algo ainda melhor do que "Pet Sounds".
Em depressão profunda, Brian virou dependente de drogas pesadas. Os Beach Boys nunca mais foram os mesmos (a não ser com o lançamento em compacto da perfeita música Good Vibrations) e sua carreira solo teve altos e baixos (mais para baixo do que para cima).
Na minha visão ignorante da música, sem dúvida os Beatles ganham dos Beach Boys, mas só na quantidade porque fizeram três obras-primas (Revolver, Rubber Soul e Sgt. Pepper's). Já na qualidade empatam com os Beach Boys.
E também querendo ser advogado do maluco do Brian Wilson, pelo que sei ele carregava os Beach Boys nas costas, os outros integrantes eram vocalistas excelentes, mas só isso. Já os Beatles tinham dois gênios (Paul e John), um guitarrista incrível (George) e o baterista mais legal do mundo (Ringo). Competição totalmente desigual.

sexta-feira, 26 de outubro de 2007

In Rainbows



1. Reinventar a música e ainda fazer sucesso com isso
Como explicar o sucesso de uma banda como o Radiohead? Eles aboliram as melodias convencionais do rock e do pop que 99,9% dos grupos usam. Barulhos, sons eletrônicos diferentes, guitarras de jazz, baterias estranhas e as letras malucas de sempre, nada que alguém tivesse coragem ou capacidade de usar no mundo da música para fazer música boa.
Ter a ousadia de lançar discos como como o "Kid A" e este novo "In Rainbows" deveria ser suficiente para jogar o Radiohead no ostracismo. Este mundo pasteurizado, fútil e efêmero das artes contemporâneas recicla lixo todo o mês, não há espaço para o diferente.
Mas todo mundo baba ovo pelo Radiohead! Ou quase todo mundo, sendo realista. Enfim, há uma espécie de quase consenso entre público e crítica de rock e pop que hoje os caras são os melhores do planeta.
Acho que esse reconhecimento é por causa do "OK Computer", de 1997. Eles fizeram um disco pop tão bom quanto os melhores do Beatles, algo que ninguém mais achava ser possível. Os fãs e reconhecimento duram até hoje, então eles têm carta branca para criarem o que quiserem. Graças a Deus!

2. Reinventar a música e ainda ganhar dinheiro com isso
"In Rainbows" foi lançado dia 10 de outubro apenas no site da banda para venda em MP3 e o consumidor pode ainda definir o preço das faixas. Foi um sucesso, só se falou disso e os caras venderam para o mundo inteiro sem precisar de gravadora.
Quer mais revolução que isso?!
E eu baixei o disco no Soulseek de graça no dia 12 de outubro. Quer mais picaretagem que isso?! Hoje é tão fácil achar música boa na internet, só precisa pagar a conexão para isso. Mesmo gostando e admirando a banda, não tenho mais vontadade (e muitas vezes grana mesmo) de comprar um CD.

Esse é o futuro, todo mundo vai copiar o Radiohead.

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

E admitam que as águas que nos cercam se elevaram (em 1964 ele previu!!!)




The Times They Are A-Changin'

Come gather 'round people
Wherever you roam
And admit that the waters
Around you have grown
And accept it that soon
You'll be drenched to the bone.
If your time to you
Is worth savin'
Then you better start swimmin'
Or you'll sink like a stone
For the times they are a-changin'.

Come writers and critics
Who prophesize with your pen
And keep your eyes wide
The chance won't come again
And don't speak too soon
For the wheel's still in spin
And there's no tellin' who
That it's namin'.
For the loser now
Will be later to win
For the times they are a-changin'.

Come senators, congressmen
Please heed the call
Don't stand in the doorway
Don't block up the hall
For he that gets hurt
Will be he who has stalled
There's a battle outside
And it is ragin'.
It'll soon shake your windows
And rattle your walls
For the times they are a-changin'.

Come mothers and fathers
Throughout the land
And don't criticize
What you can't understand
Your sons and your daughters
Are beyond your command
Your old road is
Rapidly agin'.
Please get out of the new one
If you can't lend your hand
For the times they are a-changin'.

The line it is drawn
The curse it is cast
The slow one now
Will later be fast
As the present now
Will later be past
The order is
Rapidly fadin'.
And the first one now
Will later be last
For the times they are a-changin'




OS TEMPOS, ELES ESTÃO MUDANDO

Venha se reunir povo por onde quer que andem
E admitam que as águas que nos cercam se elevaram
Aceitando isto
Logo estaremos ensopados até os ossos
Se o tempo para você vale salvar
Então é melhor começar a nadar
Ou você afundará como uma pedra
Pois os tempos, eles estão mudando

Venham escritores e críticos
Que profetizam com suas canetas
E mantenham os olhos abertos
Que a chance não se repita
E não fale cedo demais pois a roda continua girando
E não há como saber quem será nomeado
Pois o perdedor de agora
Estará mais tarde a ganhar
Pois os tempos, eles estão mudando

Venham senadores, congressistas, respondam ao chamado
Não aglomere na porta, não congestione o corredor
Pois aquele que se machuca será aquele que atravanca
Existe uma batalha lá fora urrando
Logo ela estará sacudindo suas janelas
E tremendo suas paredes
Pois os tempos, eles estão mudando

Venham mães e pais por toda a terra
E não critiquem o que não consegues compreender
Seus filhos e filhas
Estão além de seu comando
Sua velha estrada está rapidamente deteriorando
Por favor saia da nova
Se você não pode contribuir
Pois os tempos, eles estão mudando

A linha foi traçada, a maldição foi praguejada
O lento agora mais tarde será veloz
E o presente agora mais tarde será passado
A ordem rapidamente se desbota
E o primeiro agora
Mais tarde será o último
Pois os tempos, eles estão mudando

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

os caminhos da estrada de tijolos amarelos são infinitos


É demorado para carregar, mesmo com banda larga, mas vale a pena.
O que você encontra no final de OZ é incrível...
http://www.scifi.com/tinman/oz/

terça-feira, 16 de outubro de 2007

anos 70... só viagens... falta isso hoje



Errare Humanum Est

Lá lá lá
Tem uns dias
Que eu acordo
Pensando e querendo saber
De onde vem
O nosso impulso
De sondar o espaço
A começar pelas sombras sobre as estrelas-las-las-las
E depensar que eram os deuses astronautas
E que se pode voar sozinho até as estrelas-las-las
Ou antes dos tempos conhecidos
Conhecidos
Vieram os deuses de outras galáxias-xias-xias
Ou de um planeta de possibilidades impossíveis
E de pensar que não somos os primeiros seres terrestres
Pois nós herdamos uma hernaça cósmica
Errare humanum est
Errare humanum est
Nem deuses
Nem astronautas
Ô ô ô ô
Eram os deuses astronautas
Lá lá lá lá
Nem deuses
Nem astronautas
Ô ô ô ô
Eram os deuses astronautas
Lá lá lá lá
Eram os deuses astronautas
Ná ná ná ná ná
Dez
Ná ná ná ná ná
Nove
Ná ná ná ná ná
Oito
Ná ná ná ná ná
Sete
Ná ná ná ná ná
Seis
Ná ná ná ná ná
Cinco
Ná ná ná ná ná
Três
Ná ná ná ná ná
Dois
Ná ná ná ná ná
Um
Ná ná ná ná ná
Zero


(A famosa Tábua de Esmeralda sempre foi utilizada como ponto de partida para os estudiosos da alma humana. Segundo dizem, neste pequeno texto, originariamente gravado em uma esmeralda, estão encerrados os mais secretos segredos da vida. Alquimistas, filósofos, magos, cabalistas, basearam suas pesquisas neste fragmento de sabedoria atribuído a um sábio egípcio chamado Hermes Trimegisto. Daí o motivo do nome hermetismo para generalizar as diversas correntes ocultistas ao longo do tempo.)

sábado, 13 de outubro de 2007

só podia ter sido no ano que nasci...


13 de outubro de 1977
Corinthians 1x0 Ponte Preta

Em pé da esquerda para a direita: Zé Maria, Tobias, Moisés, Russo, Ademir e Wladimir. Agachados: Vaguinho, Basílio, Geraldão, Luciano e Romeu

sexta-feira, 12 de outubro de 2007

The Tiger

Tiger! Tiger! burning bright
In the forests of the night,
What immortal hand or eye
Could frame thy fearful symmetry?

In what distant deeps or skies
Burnt the fire of thine eyes?
On what wings dare he aspire?
What the hand dare seize the fire?

And what shoulder, and what art,
Could twist the sinews of thy heart?
And when thy heart began to beat,
What dread hand? and what dread feet?

What the hammer? what the chain?
In what furnace was thy brain?
What the anvil? what dread grasp
Dare its deadly terrors clasp?

When the stars threw down their spears,
And watered heaven with their tears,
Did he smile his work to see?
Did he who made the Lamb make thee?

Tiger! Tiger! burning bright
In the forests of the night,
What immortal hand or eye
Dare frame thy fearful symmetry?


O Tigre

Tigre, tigre que flamejas
Nas florestas da noite.
Que mão que olho imortal
Se atreveu a plasmar tua terrível simetria ?

Em que longínquo abismo, em que remotos céus
Ardeu o fogo de teus olhos ?
Sobre que asas se atreveu a ascender ?
Que mão teve a ousadia de capturá-lo ?
Que espada, que astúcia foi capaz de urdir
As fibras do teu coração ?

E quando teu coração começou a bater,
Que mão, que espantosos pés
Puderam arrancar-te da profunda caverna,
Para trazer-te aqui ?
Que martelo te forjou ? Que cadeia ?
Que bigorna te bateu ? Que poderosa mordaça
Pôde conter teus pavorosos terrores ?

Quando os astros lançaram os seus dardos,
E regaram de lágrimas os céus,
Sorriu Ele ao ver sua criação ?
Quem deu vida ao cordeiro também te criou ?

Tigre, tigre, que flamejas
Nas florestas da noite.
Que mão, que olho imortal
Se atreveu a plasmar tua terrível simetria ?

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

terça-feira, 25 de setembro de 2007

prefiro o original




Corinthian-Casuals Football Club

Club Rules
The Club shall be called the Corinthian-Casuals Football Club (the Club).
Its’ aims are to promote fair play and sportsmanship, to play competitive football at the highest level possible whilst remaining strictly amateur and retaining the ideals of the Corinthian and the Casuals Football Clubs.

sexta-feira, 14 de setembro de 2007

Cê Tá Pensando Que Eu Sou Loki?


Cê tá pensando que eu sou loki, bicho?
Sou malandro velho
Não tenho nada com isso

A gente andou
A gente queimou
Muita coisa por aí
Ficamos até mesmo todos juntos
Reunidos numa pessoa só
Cê tá pensando que eu sou loki, bicho?
Eu sou velho mas gosto de viajar por aí
Cilibrina pra cá
Cilibrina pra lá
Eu sou velho, mas gosto de viajar...

Cê tá pensando que eu sou loki, bicho?
So malandro velho
Não se mete no enguiço

terça-feira, 4 de setembro de 2007

sexta-feira, 24 de agosto de 2007

Stuttgart

Nunca fiz isso, juro. Mas o que tem demais? Essa carta deve ser para alguém que morou aqui há muito tempo. É uma casa velha e que eu saiba está alugada há vários anos. Talvez até o destinatário já esteja morto.

E também é uma carta da Alemanha, achei isso muito bacana. Provavelmente nunca vou ter dinheiro para ir lá. O mais longe que fui foi ao Paraguai, e olha que há dois anos.

Fiquei pensando nessas coisas uns dois dias, mas não tive coragem de abrir. E se o cara aparecesse aqui um tempo depois? “Por favor, sou o antigo morador, vim pegar minhas correspondências”. “Pois não, são essas aqui abertas, não repara não”. No mínimo ele iria me xingar, no máximo me processar.

Passaram três dias. Que se dane. Olha só, é uma carta de amor. Fala de saudade, arrependimento, pede para ele voltar a morar com ela. O de sempre. Tem até uma foto da vagabunda, bonitinha, mas não sei se vale a pena. Um pouco magrinha demais para meu gosto. Bom, tanta aporrinhação por nada. Amassei e joguei fora.

Quando voltei do trabalho no dia seguinte, na porta de casa uma surpresa estava me esperando. A alemãzinha.

- Oi, por favor, eu estou procurando o Sérgio.

- Aqui não mora ninguém com esse nome – esse era o nome do cara da carta.

- Mas esse é o endereço dele... eu mandei uma carta para cá, da Alemanha. Você recebeu?

- Não vi carta nenhuma, não – dava para perceber que ela estava aflita.

- Por favor, você tem que saber onde ele está. Eu vim da Alemanha só para ver ele, avisei na carta.

- Olha, essa é uma casa alugada. Esse cara deve ter mudado não sei quando. Eu sou o atual morador faz uns 4 meses – merda, esse aviso de que ela vinha devia estar no final da carta, mas eu nem tive saco para ler tudo, senão tinha ido dormir em outro lugar hoje.

- Me deixa entrar, eu quero ver.

Não tive tempo de impedir, enquanto falávamos eu abri a porta e ela aproveitou para entrar como um foguete.

- Eu morei aqui já, vou procurar na casa.

A mulher estava maluca, foi fuçando em cada cômodo da casa sem pedir licença. Eu queria mandar ela sumir, mas fiquei com remorsos. Achei uma bobagem aquela carta, mas ela estava desesperada mesmo.

Ela saiu do banheiro segurando um papel amassado que a besta aqui jogou na lixeira mas esqueceu de colocar na rua para o lixeiro levar hoje de manhã.

- Por que você fez isso? Seu filho da puta! Onde está o Sérgio? Me fala!!!

- Tá, tá certo. Pára de gritar na minha casa. Eu abri e li sua carta sim, desculpa, mas nunca pensei que você fosse aparecer, sei lá, uma carta da Alemanha?! Parece até sacanagem. Mas olha só, eu não faço a mínima idéia de quem é esse Sérgio. Por favor, agora vai embora e pode levar sua carta.

O que eu mais tinha medo aconteceu. Ela desabou no chão e começou a chorar.

- Eu vim de Stuttgart só para ver ele, por favor me ajuda – disse ela soluçando.

Aquilo me deixou sem ação. Já era noite, não sabia para quem pedir ajuda. Se eu fosse na polícia iria levar uma dura dos canas por ter aberto a carta. Também não adiantava ligar na imobiliária a essa hora.

- Olha, moça. se acalma, amanhã eu te ajudo, tá? Agora me diz, onde você está hospedada, eu te levo lá.

- Eu vim direto para cá.

- Mas deve ter parentes, amigos aqui, não é?

- Não, só morei um mês aqui, depois me separei do Sérgio.

- Então fodeu... vou te levar para um hotel que conheço.

- Não, eu estou com medo, me deixa ficar aqui – e foi agarrando meu braço.

- Ô que saco! Tá bom, dorme lá no meu quarto. Eu vou para o sofá, louca da Alemanha!

Falei num tom de voz agressivo, mas ela não respondeu. Apenas levantou, pediu uma toalha, tomou banho. Comeu umas barras de cereais que tinha na bolsa e foi dormir. Ofereci comida, mas disse que não queria.

Também não fiquei animado com aquilo tudo. Tinha um jogo para ver, mas nem quis ligar a TV. Fui dormir cedo no meu sofá duro e pequeno.

Acordei com aquela mulher que eu nem lembrava o nome na carta me beijando. Fiquei assustado com aquilo, mas deixei rolar. Ela me deu uma chave de pernas muito gostosa, fiquei embaixo dela sem conseguir me mexer. Pela primeira vez transei no meu sofá. Que merda de vida, precisou vir alguém da Alemanha para isso acontecer!

Depois acabei dormindo o resto da noite na minha cama mesmo, junto com ela.

Ela se levantou antes de mim e se vestiu. Quando abri os olhos, de pé na minha frente ela me passou um papel que parecia uma passagem de avião.

- Vem embora comigo – tinha a voz trêmula.

- O quê? Para Alemanha? Por quê?

- Eu fiz a loucura de vir até aqui de tão longe, atrás de um cara escroto que eu nem sei se existe mais. Ontem à noite fiz a promessa de que daria para o primeiro cara que visse só de raiva. Você deu sorte, eu saí do quarto e você estava deitado, se estivesse no banheiro, eu teria saído na rua e dado para outro. Foi muito bom, mas vazio. Por isso quero terminar da forma mais maluca possível. Você vem comigo, a pessoa que está predestinada a viver comigo por estar nos lugares e horas certos.

- Você é louca de pedra. Ou está tirando uma com a minha cara?

- Não, é sério. O avião sai depois do almoço.

Então eu olhei o bilhete. Li com calma, o horário de decolagem, o número da poltrona, o portão de embarque, o nome da empresa, tudo. Eu estava começando a querer fazer essa viagem que sonhei quando a carta chegou, por isso inconscientemente procurei alguma coisa familiar naquele papel. Talvez o horário de embarque fosse o mesmo de quando nasci. Ou a poltrona fosse o dia em que o Palmeiras ganhou a Libertadores. Mas não tinha nada, nenhum sinal.

- Tudo bem, eu vou. Mas só por um motivo que lembrei agora. Hoje vence meu aluguel e não tenho dinheiro para pagar.

domingo, 12 de agosto de 2007

Lembre e responda antes de morrer

"Esse é seu último dia de vida, Antenor. Ninguém sabe, mas quando todos estão para morrer recebem a minha visita em sonho. É de sua própria natureza estes serem estranhos, fragmentados e enigmáticos, por isso assumo essa forma de cavalo e quando você acordar não vai se lembrar de mim totalmente, só vai sentir uma sensação nova, que nunca teve durante a vida e que vai te forçar a lembrar de tudo o que fez na sua existência. Esse sonho final tem um propósito para todos, mas você terá que descobrir sozinho qual é”.

A sete palmos do chão agora consigo lembrar completamente desse sonho do cavalo que falava e relinchava, uma das formas misteriosas da morte. Aliás, a memória dos mortos é fantástica, lembro de todos os lugares onde perdi meus guarda-chuvas, de todas as moedas que recebi de troco e, infelizmente, de todas as pessoas que magoei.

O inferno é isso, irmão. Não tem fogo, chifre ou dor. É você carregar para sempre a memória da sua vida, em todos os detalhes. E aqui nesse caixão cheio de vermes não há hipnotismo ou psicanalista para me fazer esquecer as dores. Setenta e seis anos de vida, que no meu caso foram muito mais de erros do que de acertos, tudo isso me martelando sem parar.

“Sua hora chegou, dentro de um minuto você morrerá. Nesse momento de agonia, porém, vocês seres humanos têm direito de responder a uma pergunta, a mais importante da sua existência. Porém, se errarem ou não souberem a resposta, irão carregar o peso das suas lembranças para sempre. Caso acertem, têm a graça de esquecerem tudo desta vida e voltarem numa forma de vida mais evoluída, que não é a do ser humano. Preste atenção: eu tenho o poder de apagar, de consertar o erro mais cruel de sua vida, portanto, me diga qual foi ele.”

Já inconsciente e morrendo, o maldito cavalo veio com o último prego no meu caixão. Eu respondi que minha maior cagada foi ter matado meu irmão por uma dívida de jogo. Era mentira. Não sentia pena dele. Apesar de ser meu irmão, nunca me amou e era ainda pior do que eu. Infelizmente para mim, a morte também sabia o que eu sentia e quem tinha sido meu irmão.

"A resposta está errada. Seu maior erro foi ter corrompido um jovem ator de dezessete anos. Ele perdeu a família e o trabalho pelo vício que você vendia. Numa orgia ele matou a namorada e foi preso. Sua família desmoronou, os pais se separaram e seus irmãos também se transformaram em viciados. O jovem foi estuprado na prisão e morreu baleado numa tentava de fuga. E você sabia de tudo isso.”

Seis anos depois, a cada momento também me lembro desse erro final que me amaldiçoou. Antes de morrer, porém, o cavalo ainda me disse que a resposta certa estava no próprio sonho. Na cultura dos homens, os sonhos com cavalos que relincham sempre significaram conhecer alguém famoso ou importante, que no caso foi o ator idiotinha para quem vendia drogas. Esse foi o sinal dado no sonho e eu nem tinha a desculpa de dizer que nunca tinha ouvido falar desse significado dos sonhos. Minha mãe explicava coisas assim para mim e meus irmãos sempre que acordava e lembrava-se de algum sonho. Com a morte não tem discussão.

domingo, 22 de julho de 2007

paulo josé é foda!

Esse velho, que nasceu em 1937 e tem mal de Parkinson, interpreta o ranzinza Otaviano no novo filme de Jorge Furtado, "Saneamento Básico".
Paulo José participa como protagonista do que para mim é o melhor filme brasileiro já feito, "Macunaíma", e não fosse apenas isso tem uma carreira excelente.
Em "Saneamento Básico", no final de sua vida um homem pode saber muito das pessoas, ser um sábio realmente. Porém, o peso da idade e a proximidade da morte leva também a sentirem a frustação de uma vida sem todas as realizações desejadas, o que os torna frágeis como crianças.
Isso é o personagem de Paulo José, que ao lado de outro velho, Tonico Pereira, mostram com humor e dor o que é fim da vida.
Os outros atores do filme são excelentes também, aliás esse é o melhor filme de Jorge Furtado. Dá para imaginar existir uma comédia excelente que conta através de uma história metalingüística a construção de uma fossa sanitária? Pois é, o filme é isso.

O filme
O site

quinta-feira, 12 de julho de 2007

terça-feira, 3 de julho de 2007

segunda-feira, 2 de julho de 2007

Let's spend the night together


Well, don't you worry 'bout what's been on my mind
I'm in no hurry I can take my time
I'm going red and my tongue's getting tired
Out of my head and my mouth's getting dry
I'm hi-hi-hi-high

Let's spend the night together
Now I need you more than ever
Let's spend the night together now

I feel so strong that I can't disguise, oh my
Well, I just can't apologise, no
Don't hang me up but don't let me down
We could have fun just by fooling around, and around and around and a

Let's spend the night together
Now I need you more than ever
Let's spend the night together now

Oh
You know I'm smiling baby
You need some guide baby
I'm just deciding baby

Let's spend the night together
Now I need you more than ever
Let's spend the night together now

This doesn't happen to me every day
No excuses I've got anyway, heh
I'll satisfy your every need
And I'll know you'll satisfy me, oh my-my-my my-my

Let's spend the night together
Now I need you more than ever
Let's spend the night together
Now I need you more than ever
Let's spend the night together
Now I need you more than ever
Let's spend the night together
They said we were too young
Our kind of love was no fun
But our love comes from above
Do it!
Let's make love
Hoo

Let's spend the night together
Now I need you more than ever
Let's spend the night together, now


segunda-feira, 25 de junho de 2007

terça-feira, 1 de maio de 2007

Violenza Domestica


Cattivo come adesso, non sono stato mai.

Ti faro male in posti nessuno potra mai vedere...nessuno!
Posti che ti faranno male per il resto della tua vita!

Perche?
Ma perche?

Ma sempre, sempre cosi...
Guarda eh... Ma, ma voglio dire che...che
Io non sono una persona che...
Basta! basta...basta, hai capito!
Ti prego!

Sai che puoi fidarti solo di me, non ti crederanno mai.

Ascolta, ascolta, ascoltami bene, occhio!

I denti non possono dire niente, senza la lingua,
perche la tua lingua e' mia, mia, MIA!

domingo, 15 de abril de 2007

sábado, 14 de abril de 2007

O espelho de Kafka


kaf.ki.a.no adj
Relativo a Franz Kafka, escritor nascido na Tchecoslováquia (1883-1924), que usava a língua alemã. sm Admirador ou estudioso de Kafka.

Quando a obra de um escritor causa muita influência entre seus leitores, ela geralmente se transforma em adjetivo. Mais ainda: determinados autores têm seus estilos e idéias tão disseminados que, mesmo as pessoas que não os leram, aprendem que certas ocasiões da vida representam a obra daquele escritor. O termo kafkiano é um dos maiores exemplos. Verdadeiro lugar-comum usado sempre quando aparecem situações absurdas no cotidiano humano.


Os contos e romances de Kafka contam histórias de pessoas oprimidas pela família, pelo Estado, pela justiça ou burocracia, enfim, todo os mecanismos sociais que alienam o homem e atacam sua individualidade com o intuito de manter normas e condutas preestabelecidas. Essas formas de coerção nos escritos de Kafka apresentam-se nas formas mais bizarras possíveis, de modo que à primeira vista parecem completamente inverossímeis. Mas então por que muitas vezes nos sentimos tão próximos de seus personagens e conflitos?


O mundo contraditório e traumático que Kafka descrevia em seus livros era seu próprio mundo. Com a leitura das cartas a seus parentes, amigos e mulheres, e sobretudo lendo seu diário, descobre-se que a literatura de Kafka era um reflexo quase que completo de sua vida. Primeiro a difícil relação com seu pai, Hermann Kafka, comerciante de Praga avesso às artes, descrito como autoritário, explosivo e mesmo agressivo. Em 1919 Kafka enviou uma carta a seu pai, onde expôs toda a dor dessa relação. Mais tarde ela foi transformada em livro, "Carta ao Pai". Um fragmento revelador fala da submissão do jovem Kafka: "Quando começava a fazer algo que não era do teu agrado, e me ameaçavas com o fracasso, o respeito por tua opinião era tão grande que implicava, embora fosse mais tarde, que o fracasso era irremediável. Perdi a confiança em minha ação."


Kafka dizia abertamente que queria sair dos domínios de seu pai, e para isso acabou optando por uma profissão que não era de seu agrado. Formou-se em Direito e trabalhou por 14 anos em uma companhia de seguros contra acidentes do trabalho. Ocupação para ele alienante e burocrática, da qual se queixou em seu diário no ano de 1913: "Meu emprego é insuportável porque se opõe ao meu único desejo e minha única vocação, a literatura. Como eu não sou outra coisa que literatura, e não posso e nem quero ser outra coisa, meu emprego nunca conseguirá apoderar-se de mim, ainda que possa a chegar a destroçar-me totalmente. Não falta muito para isso."


Desse modo as histórias fantásticas de Kafka, com inocentes sendo condenados pela justiça, homens se transformando em insetos, leis estúpidas e sem sentido, órgãos do Estado reprimindo pessoas abertamente e naturalmente etc. são metáforas de sua vida. Para Kafka escrever, como ele dizia, era um exercício de conscientização de sua situação. Uma espécie de fuga da realidade opressora, um próprio mergulho no subjetivismo. Entretanto os escritos kafkianos desenvolvem uma estrutura mítica onde, partindo de seu individualismo, se chega ao universalismo. Isto é, Kafka representando sua própria vida em sua literatura também mostra a vida das sociedades ocidentais deste século. É uma própria síntese de um universo repressor e absurdo.


Kafka passou a maior parte de sua vida na Tchecolosváquia, então pertencente ao Império Austro-Húngaro, mas o que ele escreveu não dizia respeito apenas a seu lugar e época. O simbolismo de suas obras diz respeito a qualquer opressão da consciência humana em qualquer sociedade reificada ou coisificada que seja dominada por mitos do poder, seja em regimes capitalistas ou socialistas.


A espiral burocrática

"Alguém devia ter caluniado a Josef K., pois que sem este tivesse feito nada de mal foi detido uma certa manhã". Assim começa o que para muitos é o melhor romance de Franz Kafka, "O Processo". O autor não chegou a terminá-lo, foi publicado postumamente por seu amigo Max Brod em 1925. Como a maior parte das obras que escreveu, Kafka desejava que ela fosse destruída.


"O Processo" conta a história de um procurador de um banco de Praga, Josef K., subitamente exposto a um processo judicial sem aparentes motivos. Com efeito, o protagonista nunca chega a saber do que está sendo acusado, pois a justiça não lhe permite isso. Nesse teatro do absurdo o herói não poderia deixar de ser imperfeito e tolo: Josef K. aceita a incoerência desse caso e toma para si as formas que a justiça usa em seu dia-a-dia - a burocracia e a corrupção.


É importante perceber que o principal motivo dessa submissão a um processo ilógico vem da própria existência alienada de Josef K. Ele é descrito como um solitário homem de negócios entregue a seu trabalho no banco, onde se sente seguro, pois conhece todas as estruturas de seu funcionamento: "Todo o momento que passava fora do escritório lhe causava enormes inquietações; já não podia empregar seu tempo de trabalho de um modo tão útil quanto antes; passava muitas horas apenas fingindo que trabalhava; sua inquietação era ainda maior quando não se encontrava no Banco."


Como vários estudos marxistas apontam, o homem oprimido e alienado, seja pelo seu trabalho ou pelo Estado, perde a noção do real e passa a aceitar sua exploração. Primeiramente, Josef K. tinha uma existência centrada em seu trabalho repetitivo e formal, o que lhe acarretava uma postura não menos fria e sem sentido. Depois, quando seu processo e sua posterior burocracia judicial o atingem, ele não tem consciência do absurdo de sua nova situação, já que se encontra alienado. Não contesta sua situação, pelo contrário, procura aprender como funcionam os mecanismos da justiça, não para destruí-la, mas para se adaptar a ela.


Nessa jornada pela justiça, Kafka descreve literalmente seus corredores sinistros. Buscando informações sobre seu processo, Josef K. entra em prédios do Poder Judiciário que são verdadeiros labirintos escuros e desorganizados, onde ninguém sabe lhe informar nada com segurança. O ambiente desses lugares chega mesmo a causar vertigens e desmaios no personagem principal. Esse ponto do romance, muito similar à realidade, é exemplo do funcionamento dos órgãos burocráticos: o uso do segredo ou mistério. Esse caso retrata a burocracia judicial que, na maioria das vezes, fecha a justiça em si mesma, e não permite que ninguém saiba como ela funciona.


O caso de Josef K. é um exagero desse caráter opressor da justiça, mas não deixa de ter semelhança com os trâmites usados pela justiça real. No romance, Josef K. descobre que a hierarquia da justiça é composta por graus infinitos, pessoas nunca vistas, completamente inacessíveis ao público. Tudo muito parecido com certos magistrados da vida real, postos em verdadeiros pedestais quase inalcançáveis.


Josef K. nunca chega a ultrapassar a barreira da burocracia judicial. Seus mistérios e segredos são a forma de ela manter seu grande poder. Para isso ela serve-se da mudez de seus funcionários, das suas considerações secretas, da linguagem hermética de seus códigos e de seus procedimentos ardilosos.


Por último ressalta-se no romance a característica corrupta que uma justiça decadente atinge. O pouco que Josef K. chega a descobrir é que ela recompensa os homens que conseguem ter boas relações com seus escalões acessíveis e mais nobres. Primeiro seu advogado lhe confessa isso e depois essa idéia é reforçada pela estranha figura de um pintor retratista de juízes, Titorelli: "Por certo não li em nenhuma lei, apesar de que naturalmente tem que estar estabelecido ali que o inocente tenha de ser absolvido e, imediatamente não se estabelece nela que se possa influir sobre juízes por meio de relações pessoais. Agora bem; precisamente me inteirei de que ocorre todo o contrário, porque o certo é que não tenho conhecimento de nenhuma absolvição real, mas sim de muitos casos de influências pessoais."


Franz Kafka morreu tuberculoso em junho de 1924 num sanatório em Kierling, perto de Viena. Seus contos, romances, cartas e diários permanecem como retratos da triste condição humana, presa em sua própria contradição.

terça-feira, 20 de março de 2007

Boneco de si mesmo


Hoje é o terceiro dia que passo com o Serginho. Sem dúvida ele é uma pessoa comum. Gosta de comer fritura logo quando acorda, arrota em público, fala alto onde quer que esteja, toma pinga ao invés de água quando sente sede, canta qualquer mulher que se mexa (senão tá morta é o suficiente, ele diz), gosta de ouvir os clássicos brega dos puteiros até rachar os ouvidos e odeia futebol.
Com uma barriga protuberante e a calvice hereditária da família ele vai trabalhar todo dia às 9 da manhã como caixa em um banco. É a profissão que ele odeia por 12 anos e que me arranjou quando cheguei anteontem na sua casa sem um puto no bolso. Só com um diploma de adevogado que, além de alegrar minha mãe, hoje só serve para limpar a bunda .
Meu tio me diz tudo na lata, que eu vou achar o trabalho uma merda e ter vontade de xingar sem parar cada velho surdo ou ignorante que aparecer no meu guichê (vão ser muitos, ele diz), mas eu acho isso ótimo. O tio não passa a mão na cabeça, dá logo um safanão. E diz o que eu considero essencial: que eu vou ganhar dinheiro e depois do expediente vou poder mandar qualquer um se danar.
– Inclusive a chata da minha irmã. Diz para ela que você não é mais um nenezinho que pede dinheiro. Agora você vai é pagar um monte de cerveja para seu tio!
O dia de treinamento começa comigo sentado ao lado do meu tio, só olhando ele trabalhar. Realmente é tedioso como ele disse. Não tanto por atender chatos, eles nem são tantos assim, o ruim é repetir um milhão de vezes as coisas. Isso transforma ele em um anormal, sério e calmo, que conta as notas surradas que recebe, digita na calculadora sem olhar, checa cada assinatura, separa as moedas por valor, procura saber se cada conta está dentro da validade e não tem pena de enfiar uma multa goela baixo dos fodidos que pagam bem depois do prazo.
- Não é do seu tempo e você é muito ignorante para ter visto, mas o que eu faço aqui é ventriloquismo, como naqueles programas antigos de humor. Aqui dentro você tem que ser o boneco que conversa com o público, só que ao contrário, bonzinho e esforçado. Lá fora é que você mostra sua verdadeira voz, a podre.
Essa é a lição principal que ele disse que eu precisava aprender. A segunda é não fazer cagada perto do chefe. Com esses ensinamentos de imensa sabedoria é claro que já comecei no dia seguinte em um alto posto. Fui atender os débeis mentais que não sabem usar caixas eletrônicos.
Nessa função enobrecedora aprendi, por exemplo, que preciso valorizar cada pessoa desse mundo como indivíduos insubstituíveis. Pois quem aceitaria substituir essas bestas? Me alertaram que eu ia ver tudo aqui, gente que vem para o banco sem lembrar a senha, cara que tenta pagar contas com moeda, velho que não concorda com o extrato e acha que a culpa é sua e vários que não conseguem digitar os dados a tempo na máquina. Mas o caso mais fantástico, que ninguém no banco tinha visto, aconteceu logo comigo.
- Senhor, esse cartão é de papel e nem é deste banco. É de um chaveiro. Não tem como funcionar – rindo muito por dentro.
- Mas aqui diz para inserir o cartão, eu tou com pressa – disse rispidamente.
- Bom, usando esse cartão o senhor vai passar mil anos aí e não vai resolver nada.
- Seu moleque! Isso é jeito de falar com cliente?!
- Não vou tolerar este tipo de agressão, ainda mais levando em conta que meu tio é ventríloquo – respondi sério.
É claro que o coitado não entendeu nada e nem eu sei porque respondi isso de pronto, mas serviu para ele sair do banco sem falar mais nada. Todo mundo riu na hora, mas o tonto aqui levou seu primeiro esporro.
Depois do expediente, meu tio me indicou um filme de um maluco chamado Señor Wences. Achei engraçado mesmo, apesar de não ter cor. Resolvi começar a fazer direito no próximo dia. Afinal, como meu tio diz, nosso ventriloquismo é superior porque é egoísta. Não fazemos ninguém rir, só a nós mesmos quando termina o dia.

funk do corrupto

quarta-feira, 7 de março de 2007

A ética dos robôs será a mesma dos humanos?


O governo da Coréia do Sul lançará até o fim desde ano um código de ética para prevenir abusos de seres humanos contra robôs – e vice-versa. “O governo pretende estabelecer as normas éticas sobre o papel e as funções dos robôs porque eles deverão desenvolver uma poderosa inteligência no futuro”, explicou o Ministério do Comércio, Indústria e Energia sul-coreano, segundo a rede BBC.

O país é uma das nações que apresenta maior desenvolvimento tecnológico do planeta - o que incluiu versões avançadas de acesso à internet e telefonia celular. Recentemente, o governo de Seul divulgou prognóstico indicando que, em 2018, robôs já deverão realizar cirurgias – tal o desenvolvimento da robótica local. Previsões apontam ainda que, entre 2015 e 2020, cada casa deverá contar com os serviços de um robô.

O código de ética está sendo elaborado por uma equipe que inclui escritores de ficção científica. As regras podem refletir algumas leis expressas pelo escritor Isaac Asimov, em conto publicado em 1942. Entre elas, podem figurar o controle de seres humanos sobre as máquinas e a prevenção contra usos ilegais dos andróides.

sessão teia de aranha (eles eram muito bons)

terça-feira, 6 de março de 2007

Jean Baudrillard est mort



A situação do império deflagra, não só no Islã, uma reação. Daí essa espécie de júbilo, de fascinação em relação ao 11 de setembro, é inegável. Podemos nos sentir espantados, transtornados, mas isso não impede essa coexistência no nosso imaginário do transtorno e do júbilo, mesmo naqueles que depois fizeram todo tipo de considerações morais. Não é racional, mas é algo profundo da ambivalência das coisas, nem se precisa ir muito longe na psicanálise. E nesse caso há uma espécie de extrapolação política, e há um aspecto psicológico também. As imagens do 11 de setembro são midiáticas. Elas fazem parte do acontecimento. É um momento, como o ato em si, instantâneo, e terá quase uma repercussão viral. E agora vemos o vírus asiático, as catástrofes, os acidentes - tudo isso, objetivamente, é terrorismo.
Mesmo uma catástrofe natural é terrorismo. A natureza é destruída, domesticada, explorada e, de vez em quando, ela se vinga. Racionalmente, isso não tem sentido, mas, simbolicamente,sim. O terrorismo é epicentral. E, depois, tudo o que se produz e que desestabiliza um poder qualquer se torna terrorismo.
O próprio poder faz essa dedução, pois tudo que o ataca é designado como terrorismo. Em vez de se dizer que é uma contestação política ou algo parecido, é mais simples definir como terrorismo.
Fala-se em eixo do mal, quando as coisas são bem mais complicadas. Não há um eixo, mas um paraeixo, o eixo que passa mesmo no centro da superpotência. Não é mais um eixo, mas uma nebulosa do mal. É preciso exterminar tudo, se se quer resolver o problema.

lorca



Romance sonâmbulo

Verde que te quero verde.
Verde vento. Verdes ramas.
O barco vai sobre o mar
e o cavalo na montanha.
Com a sombra pela cintura
ela sonha na varanda,
verde carne, tranças verdes,
com olhos de fria prata.
Verde que te quero verde.
Por sob a lua gitana,
as coisas estão mirando-a
e ela não pode mirá-las.

Verde que te quero verde.
Grandes estrelas de escarcha
nascem com o peixe de sombra
que rasga o caminho da alva.
A figueira raspa o vento
a lixá-lo com as ramas,
e o monte, gato selvagem,
eriça as piteiras ásperas.

Mas quem virá? E por onde?...
Ela fica na varanda,
verde carne, tranças verdes,
ela sonha na água amarga.
— Compadre, dou meu cavalo
em troca de sua casa,
o arreio por seu espelho,
a faca por sua manta.
Compadre, venho sangrando
desde as passagens de Cabra.
— Se pudesse, meu mocinho,
esse negócio eu fechava.
No entanto eu já não sou eu,
nem a casa é minha casa.
— Compadre, quero morrer
com decência, em minha cama.
De ferro, se for possível,
e com lençóis de cambraia.
Não vês que enorme ferida
vai de meu peito à garganta?
— Trezentas rosas morenas
traz tua camisa branca.
Ressuma teu sangue e cheira
em redor de tua faixa.
No entanto eu já não sou eu,
nem a casa é minha casa.
— Que eu possa subir ao menos
até às altas varandas.
Que eu possa subir! que o possa
até às verdes varandas.
As balaustradas da lua
por onde retumba a água.

Já sobem os dois compadres
até às altas varandas.
Deixando um rastro de sangue.
Deixando um rastro de lágrimas.
Tremiam pelos telhados
pequenos faróis de lata.
Mil pandeiros de cristal
feriam a madrugada.

Verde que te quero verde,
verde vento, verdes ramas.
Os dois compadres subiram.
O vasto vento deixava
na boca um gosto esquisito
de menta, fel e alfavaca.
— Que é dela, compadre, dize-me
que é de tua filha amarga?
— Quantas vezes te esperou!
Quantas vezes te esperara,
rosto fresco, negras tranças,
aqui na verde varanda!

Sobre a face da cisterna
balançava-se a gitana.
Verde carne, tranças verdes,
com olhos de fria prata.
Ponta gelada de lua
sustenta-a por cima da água.
A noite se fez tão íntima
como uma pequena praça.
Lá fora, à porta, golpeando,
guardas-civis na cachaça.
Verde que te quero verde.
Verde vento. Verdes ramas.
O barco vai sobre o mar.
E o cavalo na montanha.

domingo, 4 de março de 2007

como nasce um herói


Já fazia um tempo que queria escrever disso. No dia 14 de fevereiro, eu conheci o vereador Octávio Rocha de Santa Bárbara D’Oeste. Em sua cidade ele também é conhecido como 'arruia', que segundo ele em libanês significa mais ou menos 'tudo bem, amigo!".
Escrevi sobre ele no jornal em que trabalho e sua história acabou também virando pauta em vários outros noticiários nacionais, como o Fantástico.
Sem dúvida ele é uma figura, muito carismático e simples. Para quem não sabe, antes de político ele foi comerciante, andarilho, morador de rua e catador de papelão. É um homem calejado e com um bom humor aparente, isto é, a arma que ele usa para esconder as amarguras que ele viveu.
O sujeito veio parar na minha cidade, segundo ele, depois de uma odisséia pelo Interior de SP. Pouco se falou disso, mas ele é viciado em jogos e bordéis, como tantas pessoas por aí. Foi numa dessas jogatinas em Campinas que ele diz ter ganhado muito dinheiro e logo em seguida agredido e assaltado.
Aí teria começado o "fantástico" - a volta do indigente. Ele diz que perdeu a memória, virou um andarilho pedinte e teria vindo parar depois de muitos dias em Bauru, onde para sobreviver teria catado papelão até recuperar a memória sem mais nem menos.
Essa história maluca encantou e deixou com água na boca todos os jornalistas, inclusive eu, que o entrevistaram no dia 14. Era a pauta que todo mundo gosta de achar e que vende jornal ou dá audiência.
Esse herói, no entanto, é um homem comum. Não há provas que ele foi assaltado, ele não tinha ferimentos aparentes na cabeça que ele disse ter sido atingida por coronhadas, ele ficou com seu celular, documentos e roupas depois do assalto, ele já havia sumido no ano passado e, adivinhem, também veio caminhando até aqui.
Eu conversei com o seu padrinho político e outros colegas da Câmara de Santa Bárbara D’Oeste. Eles disseram que o Arruia não tinha se adaptado bem à vida parlamentar, ou sendo mais direto, que sentia nojo mesmo dos políticos e de seu ambiente. Ele pessoalmente negou isso para mim, mas disse que realmente gosta de se sentir livre, viajar.
É claro que a hipótese mais plausível é que ele seja mais um Sassá Mutema da vida real e, como no ano passado, se cansou e resolveu fugir um pouco. O dinheiro que diz ter sido roubado provavelmente tenha sido é perdido nas apostas do bingo.
Até surgiu uma versão de que seu celular teria sido recarregado em uma padaria e assim recebido chamadas de amigos da sua cidade natal. Mais fantástico, sem dúvida, porém, ele e a PM me contaram outra história. O celular teria sido religado só depois dele recobrar a memória e pelos policiais.
Mas a história que ficou é a fantástica, sem dúvida muito mais saborosa. Como o grito do Ipiranga, grande mentira da história brasileira, mas que continua exaltada. Afinal precisamos de heróis.
A foto acima é de meu colega Cristiano Zanardi. O vereador posa no local onde 'morou' em Bauru, a marquise da decadente estação ferroviária na boca do lixo bauruense.

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2007

mais do mesmo


São os casos do “furo” que revelou para o país a existência de uma filha de Lula, Lurian; da entrevista com o economista Paulo de Tarso Venceslau, no chamado “caso Cpem”; do empréstimo que cinco deputados federais do PT tomaram do Sindicato dos Metalúrgicos de Manaus, sob a batuta de um colega parlamentar que confessou corrupção; e da reportagem que derrubou uma parte de versão do hoje presidente da República para a compra do apartamento em que mora, em São Bernardo do Campo.

Entre 1984 e 2005, Luiz Maklouf Carvalho acompanhou Lula, Palocci, Okamoto, José Genoino, Delúbio, Celso Daniel, José Dirceu... não é verdade que eles pisaram na bola só quando chegaram ao poder, isso começou bem antes.

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2007

A pílula



Cada vez que tomo a pílula não sinto nada. O efeito não vem nem depois de que a droga passa para a corrente sangüínea. Mas me garantiram que essa não é uma pílula de farinha, há uma química nela. Não ligo, o importante é que estão me pagando.

Escrevo isso para passar o tempo. É muito chato ficar presa dentro dessa casa. Já faz 13 dias. Não tenho muito o que fazer, a comida vem pronta, as roupas são mudadas todo dia, enfim, tudo o que eu preciso é colocado numa porta giratória. Tenho uma TV, mas é um circuito fechado que só passa filmes antigos, sem cores. Ainda bem que não sou obrigada a ver.

Acho que nunca aceitaria viver aqui sem a grana. A Luísa me convenceu. Depois de tanto tempo sem ver ela, resolvi acreditar que o dinheiro era fácil. Ela estava certa, todo o dia antes das entrevistas eles me mostram os recibos dos depósitos.

Posso usar o dinheiro para viajar. De quem sinto mais saudade aqui? É lógico que é você, Alice. Pena que você nunca mais vai querer olhar na minha cara. Se não fosse isso já teria saído dessa casa. Você acabou comigo, linda. Mas pelo menos vou ficar rica. O melhor mesmo é ir para longe. Um lugar para ficar quieta e te esquecer.

Só que aqui não vou conseguir. Esse médico só faz perguntas do que eu vivi, faz questão de detalhes. Essa semana percebi que conto coisas para ele que nunca contaria a ninguém. No contrato que assinei esse lugar se compromete a nunca divulgar meu nome, talvez seja isso.

Quando tinha 16 anos me deu vontade de brincar com uma garrafa. Era uma fanta, só que antes de enfiar eu quis beber. Como fui burra! O ar da garrafa prendeu ela dentro de mim. Meus pais tentaram arrancar mas doía muito, eu gritava. Como o resto da minha família, eu já era peluda naquela época. Os pêlos pubianos ficaram presos e cada vez que puxavam era uma dor horrível. Meu pai queria puxar até arrancar, mas minha mãe implorou para ele chamar um médico, que só conseguiu tirar depois de serrar o vidro.

É claro que todo mundo ficou sabendo na rua e na escola. Os meninos passaram a andar com uma garrafa de fanta na mochila e quando me viam sempre me perguntavam rindo se eu queria usar. Até minhas amigas queriam saber se minha boceta tinha ficado larga. Eu queria morrer. Foi o que contei ontem na entrevista.

Sempre tive dificuldade de falar sobre tudo que possa ser relacionado com sexo. Aqui aprendi aqui a contar tudo o que me envergonha ou me magoou. Mas não me sinto melhor com isso, continuo sentindo vergonha e mágoa do mesmo jeito. Quem disse que falar a verdade faz bem? Só espero juntar dinheiro com isso, quando sair sei que as coisas vão ser iguais.

- Então esse paciente chegou num estágio tão avançado da mitomania que mentia para todos ser mulher e inventava coisas até escrevendo?

- Sim, a droga só conseguiu fazer parar a depressão. Um dia trouxemos essa Alice aqui. A princípio ele reagiu bem, mas gritou quando ela lhe chamou de mentiroso. Mas Alice, eu já disse que não sou mitômano! – ele gritou várias vezes.

- O que aconteceu com ele?

- Praticamente não reagiu aos tratamentos. Está internado aqui há seis anos e pensa estar juntando uma bolada. Por enquanto, essa é a única vida em que ele já se ajustou.

quinta-feira, 15 de fevereiro de 2007

terça-feira, 13 de fevereiro de 2007

iraque? guerra civil? não, é só o rio de janeiro, mané!

Só nos 12 primeiros dias de fevereiro

120

pessoas morreram assassinadas no Rio de Janeiro. Foram

10

homicídios por dia.

O que significa

1

homicídio a cada 2 horas e 24 minutos.

Essa chaga carioca e brasileira vai até onde?


domingo, 11 de fevereiro de 2007

nanosonhos


Ainda não sabemos se a ciência vai salvar a humanidade, mas seus cabelos, quanta diferença!
De bobeira na rua, vi um salão de beleza que oferece um tratamento de nanoqueratinização. Logo pensei que isso na verdade fosse mais nanopicaretagem, aproveitando essa onda da nanotecnologia.
Pesquisei um pouco na internet sobre isso e parece que isso é sério mesmo... é uma espécie de técnica que transforma a queratina em moléculas que aderem nas falhas do cabelo. Agora se funciona não tenho idéia.
A unidade de medida nano vale um milésimo de milionésimo. A primeira vez que li sobre essa tecnologia foi num texto que falava nas possibilidades de serem criados robôs para entrarem no corpo humano para realizarem cirurgias. Como naqueles filmes que encolhem as pessoas (Viagem Fantástica/Viagem Insólita) e as colocam em naves que circulam no sistema sangüíneo.
Esses robozinhos seriam construídos a partir da manipulação de átomos e teriam usos os mais variados, importantes e nem tanto, possíveis: medicina, eletrônica, ciência da computação, física, química, biologia, engenharia dos materiais, cosméticos, tecidos que não amassam etc.
Foi em 1959 que o físico americano Richard Feynman anunciou ao mundo a idéia de manipulação da matéria em escala atômica e hoje, como descobri, já existe até em salão de cabeleireiro.
Hoje outro maluco americano, Eric Drexler, pensa formas de construir esses robozinhos. Daqui 20, 100, 1.000 anos, ele diz ser possível inventar o Manipulador Universal, uma máquina para manipular átomos e construir qualquer outra imaginada pela mente humana e a possibilidade de regeneração celular com a nanotecnologia que decretaria o fim do envelhecimento.

terça-feira, 6 de fevereiro de 2007

O filme é uma merda, mas o diretor é genial

Essa frase que o Paulo Francis criou para definir o Cinema Novo também é boa para o diretor Nilson Primitivo. Li sobre ele em uma entrevista no Overmundo. Seus filmes são altamente experimentais: geralmente são curtas em 16 mm, com fotografia quase sempre P&B carregada nas sombras, com negativos sujos, roteiros absurdos, trilha sonora desconexa com as imagens, narrações malucas, tudo orgânico, primitivo mesmo.
Sem dúvida para quem está acostumado com o cinema convencional sua obra parece um lixo, mas sem dúvida também que são essas pessoas que mostram as novas possibilidades para a arte. O Cinema Novo era isso, filmes super baratos, feios mesmo, mas com muita criatividade e que moldaram uma época.
O Nilson também é parceiro do Rodrigo Amarante do Los Hermanos. Ele atua como ator, produtor e roteirista de vários filmes dele. Em parceria dirigiram "Dupla Face", 16mm que originou o clipe de Sentimental.

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2007

exílio


Primeiro capítulo do livro que conta como foi o exílio na África de Jean Nicholas-Arthur Rimbaud.

mais um defunto que faz falta

Da série interminável de homenagens aos aniversários dos mortos, afinal brasileiro só fala bem de fulano quando ele abotoa o paletó de madeira, aí vão momentos especiais de Franz Paulo Trannin da Matta Heilborn (1930-1997). o cara era foda.

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2007

outro que faz falta...

Francisco de Assis França (13/3/1966 - 2/2/1997)

Caranguejos com Cérebro

Mangue, o conceito
Estuário. Parte terminal de rio ou lagoa. Porção de rio com água salobra. Em suas margens se encontram os manguezais, comunidades de plantas tropicais ou subtropicais inundadas pelos movimentos das marés. Pela troca de matéria orgânica entre a água doce e a água salgada, os mangues estão entre os ecossistemas mais produtivos do mundo.

Estima-se que duas mil espécies de microorganismos e animais vertebrados e invertebrados estejam associados à vegetação do mangue. Os estuários fornecem áreas de desova e criação para dois terços da produção anual de pescados do mundo inteiro. Pelo menos oitenta espécies comercialmente importantes dependem do alagadiço costeiro.

Não é por acaso que os mangues são considerados um elo básico da cadeia alimentar marinha. Apesar das muriçocas, mosquitos e mutucas, inimigos das donas-de-casa, para os cientistas são tidos como símbolos de fertilidade, diversidade e riqueza.

Manguetown, a cidade
A planície costeira onde a cidade do Recife foi fundada é cortada por seis rios. Após a expulsão dos holandeses, no século XVII, a (ex)cidade “maurícia” passou desordenadamente às custas do aterramento indiscriminado e da destruição de seus manguezais.

Em contrapartida, o desvario irresistível de uma cínica noção de “progresso”, que elevou a cidade ao posto de “metrópole” do Nordeste, não tardou a revelar sua fragilidade.

Bastaram pequenas mudanças nos ventos da história para que os primeiros sinais de esclerose econômica se manifestassem, no início dos anos setenta. Nos últimos trinta anos, a síndrome da estagnação, aliada à permanência do mito da “metrópole” só tem levado ao agravamento acelerado do quadro de miséria e caos urbano.

Mangue, a cena
Emergência! Um choque rápido ou o Recife morre de infarto! Não é preciso ser médico para saber que a maneira mais simples de parar o coração de um sujeito é obstruindo as suas veias. O modo mais rápido, também, de infartar e esvaziar a alma de uma cidade como o Recife é matar os seus rios e aterrar os seus estuários. O que fazer para não afundar na depressão crônica que paralisa os cidadãos? Como devolver o ânimo, deslobotomizar e recarregar as baterias da cidade? Simples! Basta injetar um pouco de energia na lama e estimular o que ainda resta de fertilidade nas veias do Recife.

Em meados de 91, começou a ser gerado e articulado em vários pontos da cidade um núcleo de pesquisa e produção de idéias pop. O objetivo era engendrar um “circuito energético”, capaz de conectar as boas vibrações dos mangues com a rede mundial de circulação de conceitos pop. Imagem símbolo: uma antena parabólica enfiada na lama.

Hoje, os mangueboys e manguegirls são indivíduos interessados em hip-hop, colapso da modernidade, Caos, ataques de predadores marítimos (principalmente tubarões), moda, Jackson do Pandeiro, Josué de Castro, rádio, sexo não-virtual, sabotagem, música de rua, conflitos étnicos, midiotia, Malcom Maclaren, Os Simpsons e todos os avanços da química aplicados no terreno da alteração e expansão da consciência.

Bastaram poucos anos para os produtos da fábrica mangue invadirem o Recife e começarem a se espalhar pelos quatro cantos do mundo. A descarga inicial de energia gerou uma cena musical com mais de cem bandas. No rastro dela, surgiram programas de rádio, desfiles de moda, vídeo clipes, filmes e muito mais. Pouco a pouco, as artérias vão sendo desbloqueadas e o sangue volta a circular pelas veias da Manguetown. (Fred 04)

In memoriam - Momofuku Ando (1910-2007)


miojo

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2007

DOS MUNDOS

Deus criou este mundo. O homem, todavia,
Entrou a desconfiar, cogitabundo...
Decerto não gostou lá muito do que via...
E foi logo inventando o outro mundo.

Mario Quintana - Espelho Mágico

quarta-feira, 31 de janeiro de 2007

RG



Me abaixei para pegar um documento de identidade que encontrei na rua. Logo vi que tinha o meu rosto, apesar de mais jovem. O nome era outro e a data de nascimento também. Pensei que pudesse ser alguma falsificação, mas o número do documento era diferente do meu.
Guardei no bolso e fui embora pensando no homem da foto. Queria conhecê-lo , saber se é algum parente. No meio da manhã liguei para minha mãe e perguntei se conhecia aquele sujeito. A resposta foi uma pergunta:
- De onde você tirou esse nome?
Nunca gostei desse jeito de me tratar, como se eu sempre estivesse em risco ou fosse retardado. Preferi dizer que ele tinha passado no meu trabalho quando eu não estava e deixado lembranças para mim, mas não havia dito se era amigo ou parente. Seu tom de voz mudou do espanto para o aborrecimento:
- Eu não sei quem é, mas fica longe desse homem... vai saber quem pode ser!
Dei uma risada e me despedi. Antes, porém, ela disse para avisar se ele aparecesse de novo e pediu para passar na sua casa quando acabasse meu expediente. Não me preocupei mais com isso, mais tarde ou outro dia ia falar com um conhecido meu na polícia sobre o documento.
No final do dia fui beber um pouco em um bar perto do trabalho. Velhos ressentimentos também foram ingeridos junto com a cerveja. É isso na verdade que te faz ficar bêbado, na garrafa junto com a bebida eles colocam pequenas porções daquilo que incomodam as pessoas, seja o que querem esconder ou libertar. O álcool só estimula a beber numa quantidade suficiente para que esses monstrinhos possam fazer o serviço dentro do corpo.
A minha dose tinha a frustação com minha família. Esse documento que encontrei na rua bem que poderia ser a chance de me aproximar mais de meus parentes. Sei que eles pedem dinheiro, te julgam, exigem hipocrisia, dão presentes horríveis e várias outras maravilhas, mas dá muita inveja ver meus amigos serem abraçados e beijados pelos pais. Já passei dos 30, tenho meu emprego e minha casa, mas este homem que olha para o fundo de um copo de cerveja num bar esfumaçado queria voltar a ser criança para tentar de novo.
Passei muito tempo culpando quem me criou por essa forma de isolamento. Minha família mal conversa e se vê, sempre foi assim. No final é um ciclo de brutalidade, meus avôs fizeram isso com meus pais também. Um monte de filho para alimentar, quase nenhum ensino, um emprego vagabundo na roça que pagava uma miséria e tirava o couro. Se embebedar e descontar nos filhos era a opção mais fácil mesmo para meus avôs. Foi essa a educação da minha família. É claro que o mundo está cheio de histórias assim, mas isso lógico que não é consolo. Queria mesmo é conhecer alguém parecido comigo, de preferência para beber e chorar.
Após os tradicionais malabarismos para não tropeçar na rua cheguei em casa e caí na cama com a roupa do trabalho mesmo. Não sei ao certo quanto tempo dormi, mas não deve ter sido muito porque acordei com pouca ressaca, apesar de bem cansado. No fim das contas não fez importância, o motivo para ter despertado foi bem pior. Meu pai me ligou e dizia que minha mãe estava morta.
Ele chegou do trabalho e encontrou ela caída no chão com um ferimento de bala no peito. Desliguei e imediatamente comecei a chorar. Além da dor da perda, senti culpa por não ter ido ir ver ela como havia pedido. Fiquei mal também por tudo aquilo que havia pensado no meu porre e de certa forma por ter julgado ela. E também porque percebi a voz embargada de meu pai, um som que nunca tinha ouvido na vida.
É interessante que na hora da pancada, seja ela boa ou ruim, você não tem noção de que seus sentimentos têm uma avalanche de ingredientes. Naqueles segundos, depois que larguei o telefone e fui pegar um carro, eu apenas chorava e sentia dor, só depois fui pensar em tudo que estava me dilacerando.
A casa e a rua dela estavam cheias de gente. Entrei pela porta da frente sem pressa, procurando pedir licença para aqueles que não me reconheciam, fazendo pouco barulho. Acho que era medo de ver ela morta, deitada no chão sem movimento.
O corpo estava na cozinha com um lençol por cima. Foi estranho, nesse momento foi embora todo o receio que sentia, automaticamente me abaixei e descobri minha mãe. De olhos fechados, a expressão no rosto não era de medo ou angústia pela morte, mas comum. Eram os mesmos olhos cansados, a boca sempre sem batom e o cabelo pentedo para trás. Será que todos os mortos são assim? Quando percebemos que não tem mais volta, tudo fica para trás e morrer é o caminho aceito de bom grado?
Notei o ferimento no peito e o medo voltou. Rapidamente cobri ela de novo e fui procurar meu pai. Ele estava logo atrás de mim. Nós dois já não chorávamos mais. Tive o reflexo de abraçá-lo, mas não fiz isso. Tenho certeza que ele também quis fazer isso. De novo nosso distanciamento falou mais alto. Perguntei o que aconteceu:
- Me disseram que você veio aqui de noite. O que aconteceu? – ele respondeu perguntando com angústia.
- Como? Não, ela me pediu para vir aqui hoje mas não pude vir – porque eu não disse que na verade eu não quis aparecer?
- Dois vizinhos te viram passar na rua e entrar na casa – ele apontou para pessoas que realmente eu conhecia, mas que não via fazia tempo.
- Não, deve ter sido outra pessoa... eu, eu estava no bar bebendo e depois fui para casa – disse com vergonha.
- Paulo, filho, me diz a verdade... quero saber quem fez isso – logo depois começou a chorar. Foi uma das poucas vezes que ele me chamou de filho.
Meu pai foi para a sala e sentou-se em silêncio. Os vizinhos vieram falar comigo e disseram ter certeza de que era eu, apesar de não ter cumprimentado nenhum deles. A polícia também veio falar comigo e me fazer perguntas. Disse os horários que saí do trabalho e passei no bar. No meu prédio não tem porteiro nem câmera, então só não poderiam confirmar minha chegada em casa.
A polícia disse que não havia sinais de arrobamento ou luta na casa e nada parecia ter sumido. Os vizinhos também não ouviram nenhum barulho. Ao que parece, o assassino foi servido pela minha mãe antes do crime. Comeu doce de banana e bebeu refrigerante.
Era um dos muitos doces de minha mãe que eu gostava de comer. Só nesse instante lembrei do que aconteceu de manhã. Tirei do bolso o documento de identidade que achei.
- Deve ter sido esse filho da puta! – disse com raiva, lembrando a reação estranha da minha mãe quando falei seu nome por telefone.
Contei o caso para a polícia e disse que poderia ter sido ele. Me disseram que parecia de fato um documento verdadeiro mas precisava antes ser checado no sistema de registro geral da polícia. Enquanto faziam isso perguntei ao meu pai se ele conhecia alguém com esse nome ou mesmo se eu não poderia ter algum parente muito parecido comigo. A resposta também foi negativa, mas diferente da minha mãe ele falou com convicção.
Após a polícia técnica terminar de analisar a cena do crime e levarem o corpo da minha mãe para o IML, o pessoal que foi checar o documento voltou. Nem o nome nem o número existiam. Para o Estado aquele rosto não pertencia a ninguém. A única coisa que poderiam fazer quando amanhacesse era investigar como aquele documento foi forjado.
Isso me deixou preocupado também com meu pai. Não sabia se o cara que fez isso iria atrás dele. Liguei para aquele conhecido meu da polícia e expliquei o que estava acontecendo. Pelo menos até de manhã a polícia poderia acompanhar meu pai, já que ele teria mesmo que prestar mais depoimentos e depois buscar o corpo. Também recebi a indicação de conversar com o delegado de plantão. Ele disse que ia designar um policial para acompanhar meu pai até o meio dia.
Para mim, como irmão mais velho, me restou apenas ficar maluco cuidando de toda a burocracia de funerária e buscar dinheiro para pagar todas as despesas dos mortos (atestados, caixão, lápide, coveiro, flores etc.). Passei em casa para tomar um banho antes e aliviar um pouco a ressaca que começava a ficar forte.
Sentado na minha cama encontrei o homem a quem pertencia o documento de identidade. Ele tinha realmente os meus olhos grandes, nariz redondo, boca fina e sombrancelha grossa. O formato do rosto também era igual, quadrado com testa larga. A cor da sua pele apenas era diferente, muito branca e com sardas, diferente de mim que sou pardo.
- Quem é você? – perguntei assustado.
- Sou seu irmão mais velho.
- Foi você que matou minha mãe?
- Escuta, eu não tinha a intenção de te conhecer, mas aquela mulher disse que você perguntou pelo meu outro nome hoje. Eu imaginei que você deve ter encontrado meu documento falso que perdi.
- Responde! – gritei.
- Sim, fui eu que matei – ele tirou da cintura um revólver.
- Por quê?
- Antes de você nascer, uns quatro anos antes, ela me deixou na rua. Eu era bebê de poucos meses. Isso foi em outro estado, ninguém conhecia ela lá. Apenas deixou um bilhete pedindo que eu fosse registrado como Ciro Valdez, o nome de um ator de novela que ela achava bonito na época. Dá para acreditar? Naquele dia eu peguei uma pneumonia e fiquei doente meses segundo o que me contaram depois. No orfanato que fiquei também peguei um monte de doença, caxumba, sarampo, diarréia, sempre sarava e pegava outra, nunca fui adotado e sei que foi por isso que nunca fui adotado. Por ser pobre e sozinho nunca consegui estudar direito também. Acabei indo preso por roubar uma loja e para não ser dedo duro mofei cinco anos na cadeia. Decidi que a única razão da minha vida fodida era encontrar meus pais e matar os dois. Meu pai, infelizmente, já cuidou disso, ele morreu quando eu tinha cinco anos, mas pelo menos foi atropelado. E hoje eu matei nossa mãe.
- Você vai me matar também?
- Não, não sei ainda. Eu não tinha a intenção nem de te ver, mas você tinha que achar meu documento. Eu fiz questão de trocar de nome quando fiz 18 anos, mas não sei porque motivo escolhi a porra do nome que a nossa mãe me deu para fazer o documento falso. Se acharem ele vai ficar mais fácil me encontrar.
- Eu já entreguei para a polícia, seu bosta! – a raiva tinha voltado.
- Calma, irmão. Assim vou ter que te matar também, sinto muito.
- Então faz isso logo! Sabe que eu quis te conhecer quando encontrei sua foto na rua? Pensei até tomar uma cerveja junto com você, contar como é a merda da minha vida. Que palhaçada! Antes você tivesse morrido de pneumonia!
- Foi nisso que eu pensei hoje, mano, quando matei a mãe.
- Cara, você pensa que é o coitadinho? Pode ter sofrido mais que a gente, mas todo mundo aqui nessa família tem uma vida difícil.
- Cala a boca playboy! – disse chorando e apontando a arma para mim – Eu só queria saber porque ela me abandonou. Sabe o que ela disse? Que era muito nova, pobre, burra e tinha medo dos pais. Eu percebi sim que ela era uma coitada, mas não tinha volta. Tinha que matar. No fundo eu sei que minha vida vai piorar agora, mas eu não tô nem aí. Eu não era para ter nascido mesmo.
Levei uma coronhada na cabeça e desmaei. Nunca mais vi meu irmão e também achei melhor não contar para a polícia o que aconteceu. Mas pedi o documento de identidade de volta. Até hoje carrego ele no bolso.