domingo, 4 de março de 2007
como nasce um herói
Já fazia um tempo que queria escrever disso. No dia 14 de fevereiro, eu conheci o vereador Octávio Rocha de Santa Bárbara D’Oeste. Em sua cidade ele também é conhecido como 'arruia', que segundo ele em libanês significa mais ou menos 'tudo bem, amigo!".
Escrevi sobre ele no jornal em que trabalho e sua história acabou também virando pauta em vários outros noticiários nacionais, como o Fantástico.
Sem dúvida ele é uma figura, muito carismático e simples. Para quem não sabe, antes de político ele foi comerciante, andarilho, morador de rua e catador de papelão. É um homem calejado e com um bom humor aparente, isto é, a arma que ele usa para esconder as amarguras que ele viveu.
O sujeito veio parar na minha cidade, segundo ele, depois de uma odisséia pelo Interior de SP. Pouco se falou disso, mas ele é viciado em jogos e bordéis, como tantas pessoas por aí. Foi numa dessas jogatinas em Campinas que ele diz ter ganhado muito dinheiro e logo em seguida agredido e assaltado.
Aí teria começado o "fantástico" - a volta do indigente. Ele diz que perdeu a memória, virou um andarilho pedinte e teria vindo parar depois de muitos dias em Bauru, onde para sobreviver teria catado papelão até recuperar a memória sem mais nem menos.
Essa história maluca encantou e deixou com água na boca todos os jornalistas, inclusive eu, que o entrevistaram no dia 14. Era a pauta que todo mundo gosta de achar e que vende jornal ou dá audiência.
Esse herói, no entanto, é um homem comum. Não há provas que ele foi assaltado, ele não tinha ferimentos aparentes na cabeça que ele disse ter sido atingida por coronhadas, ele ficou com seu celular, documentos e roupas depois do assalto, ele já havia sumido no ano passado e, adivinhem, também veio caminhando até aqui.
Eu conversei com o seu padrinho político e outros colegas da Câmara de Santa Bárbara D’Oeste. Eles disseram que o Arruia não tinha se adaptado bem à vida parlamentar, ou sendo mais direto, que sentia nojo mesmo dos políticos e de seu ambiente. Ele pessoalmente negou isso para mim, mas disse que realmente gosta de se sentir livre, viajar.
É claro que a hipótese mais plausível é que ele seja mais um Sassá Mutema da vida real e, como no ano passado, se cansou e resolveu fugir um pouco. O dinheiro que diz ter sido roubado provavelmente tenha sido é perdido nas apostas do bingo.
Até surgiu uma versão de que seu celular teria sido recarregado em uma padaria e assim recebido chamadas de amigos da sua cidade natal. Mais fantástico, sem dúvida, porém, ele e a PM me contaram outra história. O celular teria sido religado só depois dele recobrar a memória e pelos policiais.
Mas a história que ficou é a fantástica, sem dúvida muito mais saborosa. Como o grito do Ipiranga, grande mentira da história brasileira, mas que continua exaltada. Afinal precisamos de heróis.
A foto acima é de meu colega Cristiano Zanardi. O vereador posa no local onde 'morou' em Bauru, a marquise da decadente estação ferroviária na boca do lixo bauruense.
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