No ano de 2010, no mês de setembro, pouco antes do primeiro turno das eleições presidenciais, começaram a aparecer nos principais jornais e revistas de circulação nacional denúncias contra a ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra, ex-assessora da candidata do PT à Presidência da República, Dilma Rousseff. O caso teve muitas situações descritas na teoria social do escândalo de John B. Thompson, como os aparecimentos de negações e transgressões de segunda ordem.
Esse trabalho primeiro vai explicar as denúncias contra Erenice Guerra, relatar as teorias de Thompson e associar esse caso brasileiro com as idéias do autor inglês.
Laços de família em Brasília
Erenice Guerra foi o braço direito da hoje presidente eleita Dilma Rousseff durante o período em que esta foi ministra. Mas as duas se conheceram apenas em 2002, quando Dilma foi integrar o grupo de transição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na área de energia.
Dilma havia sido Secretaria de Minas e Energia do governo gaúcho de Olívio Dutra e saído recentemente do PDT para o PT. Já Erenice integrava a equipe de advogados da liderança do PT na Câmara. As duas acabaram se conhecendo no núcleo de energia da transição de Lula porque Erenice tinha também um passado na Eletronorte.
O presidente Lula acabou indicando Dilma para ministra das Minas e Energia e Dilma depois indicou Erenice para o cargo de consultora jurídica do ministério. As duas permaneceram quase oito anos trabalhando juntas. Quando Dilma foi para a Casa Civil em junho de 2005, Erenice foi junto como sua assessora.
Dilma ficou nesse cargo até março de 2010, quando se desligou para a campanha à Presidência. Em seu lugar foi escolhida a então secretária-executiva do ministério: Erenice Guerra.
Mas o período de Erenice como ministra foi curto, ela não resistiu às denúncias de tráfico de influência envolvendo ela e seus parentes.
O caso envolveu os três irmãos de Erenice: Maria Euriza Alves Carvalho, Antônio Eudacy Alves Carvalho e José Euricélio Carvalho, que tiveram cargos públicos federais comissionados, mas deixaram os postos em 2008, após o Supremo Tribunal Federal proibir oficialmente o nepotismo. Além disso, um dos filhos da ministra, Israel Guerra, também foi envolvido nas denúncias.
Uma das principais denúncias é de que Israel Guerra teria feito lobby para que a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) liberasse a concessão dos vôos da MTA Linhas Aéreas, que fora suspensa. Mais tarde, a MTA fechou contrato de R$ 19,6 milhões com os Correios, sem licitação, para transporte de carga.
O lobby teria sido feito por meio da empresa Capital Assessoria e Consultoria, na qual são sócios, além de Israel, Vinicius Castro, funcionário da Casa Civil, e Stevan Knezevic, servidor da Anac, então lotado na Presidência. Em troca da intermediação, Israel cobraria uma “taxa de sucesso” (propina) de 6% sobre os contratos, e a própria Erenice teria cobrado o empresário Fábio Baracat, ex-sócio da MTA. A prática teria começado em 2009, ainda com Dilma na Casa Civil, mas supostamente sem o conhecimento da então ministra.
Depois, foi denunciado que como ministra Erenice passou a ter ingerência nos Correios, órgão que boa parte da mídia costuma associar com corrupção em seu alto escalão. O presidente dos Correios, David José de Matos, e a diretoria da estatal teriam aprovado um contrato superfaturado em R$ 2,8 milhões para favorecer outra empresa de carga aérea. A contratação, feita pela nova direção da estatal nomeada pela então ministra-chefe da Casa Civil, Erenice Guerra, manobrou para ressuscitar, em agosto, uma licitação que havia sido cancelada três meses antes pelo comando demitido da estatal.
Os documentos obtidos e divulgados pelo jornal “O Estado de S.Paulo” mostram que a nova diretoria, empossada no dia 2 de agosto, entregou para a Total Linhas Aéreas um contrato de R$ 44,3 milhões. E concluiu o negócio em apenas duas semanas.
Os outros casos que a mídia noticiou envolveram fatos mais remotos ligados a Erenice e/ou seus parentes. Por exemplo, Em 1997, Erenice Guerra teria usado um “laranja” para abrir a empresa de investigação particular Conservadora Asa Imperial em nome de seu filho Israel Guerra. A “laranja” seria a professora desempregada Geralda Amorim de Oliveira, que confirmou ter fornecido documentos para a abertura da empresa. Geralda Amorim de Oliveira é irmã de uma amiga antiga de Erenice.
Em outro caso, segundo uma auditoria da CGU (Controladoria-Geral da União), José Euricélio de Carvalho seria responsável pelo desvio de R$ 5,8 milhões da editora da UnB (Universidade de Brasília). O desvio, parte de um esquema que teria deixado um prejuízo de R$ 10 milhões na editora, incluiria pagamentos para Carvalho e Israel Guerra.
Reações
A onda de denúncias contra Erenice e seus parentes começou em 11 de setembro de 2010. A revista “Veja” revelou primeiro que o filho da ministra, Israel Guerra, integrava um esquema de lobby Anac/Correios com o objetivo de intermediar contratos e benefícios com o governo federal. Com isso, outras revistas e TV, rádio, jornais e internet passaram a repercutir as acusações e foram trazendo fatos novos dessas e outras investigações. Praticamente por um mês inteiro essas denúncias foram o principal alvo do noticiário.
Após as denúncias da “Veja”, Erenice colocou seus sigilos fiscal, bancário e telefônico e os de sua família à disposição das autoridades competentes, além de negar tudo.
“Sinto-me atacada em minha honra pessoal e ultrajada pelas mentiras publicadas sem a menor base em provas ou em sustentação na verdade dos fatos, cabendo-me tomar medidas judiciais para a reparação necessária. E assim o farei. Não permitirei que a revista 'Veja', contumaz no enxovalho da honra alheia, o faça comigo sem que seja acionada tanto por danos morais quanto para que me garanta o direito de resposta”, disse em nota.
Ela ainda lamentou que o processo eleitoral, “no qual a citada revista está envolvida da forma mais virulenta e menos ética possível, propicie esse tipo de comportamento e a utilização de expediente como esse, em que se publica ataque à honra alheia travestido de material jornalístico sem que se veicule a resposta dos ofendidos”.
E também se defendeu na nota chamando o candidato da oposição à Presidência José Serra de “candidato aético e já derrotado, em tentativa desesperada da criação de um 'fato novo' que anime aqueles a quem o povo brasileiro tem rejeitado”. Ou seja, ela chegou a afirmar que as denúncias na mídia eram orquestração da oposição.
A então ministra também pediu à Comissão de Ética Pública da Presidência da República a imediata instauração de procedimento para apurar a sua conduta em relação às acusações.
Mas Erenice caiu rápido. No dia 16 de setembro, o jornal “Folha de S.Paulo” noticiou que uma empresa de Campina, EDRB do Brasil Ltda., confirmou outro lobby operaria dentro da Casa Civil da Presidência da República e acusou de novo o filho da ministra Erenice Guerra de cobrar dinheiro em 2009 para obter liberação de empréstimo no BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). No mesmo dia da matéria Erenice foi exonerada pelo presidente Lula.
A mídia divulgou que o fato de haver muitos familiares dela envolvidos em caso de lobby passando pela Casa Civil, tornou sua situação “insustentável” perante o presidente. Pesou ainda contra Erenice a publicação da nota atacando o candidato tucano José Serra, sem consultar nem mesmo o presidente sobre o conteúdo do documento.
Em sua carta de demissão, Erenice Guerra afirmou que precisa de “paz e tempo” para se defender das acusações de lobby. Esses são alguns trechos:
“Senhor presidente, por ter formação cristã não desejo nem para o pior dos meus inimigos que ele venha a passar por uma campanha de desqualificação como a que se desencadeou contra mim e minha família. As paixões eleitorais não podem justificar esse vale-tudo.
Preciso agora de paz e tempo para defender a mim e minha família fazendo com que a verdade prevaleça, o que se torna incompatível com a carga de trabalho que tenho a honra de desempenhar na Casa Civil.”
Até o momento em que este trabalho foi escrito a última informação sobre o caso Erenice, dia 16 de novembro, é que a Casa Civil da Presidência da República prorrogou por mais 20 dias a sindicância instaurada em setembro para investigar suposta prática de influência no ministério. O prazo inicial da sindicância era de 30 dias. Acabou sendo prorrogada pelo mesmo período, impedindo que o resultado e o teor das investigações internas fosse conhecido antes da realização do segundo turno das eleições presidenciais. A Polícia Federal também prorrogou seu prazo de investigação.
A teoria social do escândalo
Para Thompson, no final do século 20 o escândalo assumiu uma importância na vida pública que ultrapassa a importância que ele possuiu para as gerações anteriores. Tanto que o principal marqueteiro da campanha de Dilma Rousseff, João Santana, admitiu em entrevista ao jornal “Folha de S.Paulo” do dia 6 de novembro que o caso Erenice provocou o 2º turno.
“O caso Erenice foi o mais decisivo porque atuou, negativamente, de forma dupla: reacendeu a lembrança do mensalão e implodiu, temporariamente, a moldura mais simbólica que estávamos construindo da competência de Dilma, no caso a Casa Civil”, disse João Santana.
Thompson ressalta que essa força do escândalo hoje está ligada a vários fatores, uma série de desenvolvimentos que possuem longa história e que tiveram profundo e duradouro impacto na vida social e política.
O principal apontado é o caráter de mudança dos meios de comunicação, que transformaram a natureza da visibilidade e alteraram as relações entre a vida pública e privada. “Nessa era moderna de visibilidade mediática, o escândalo é um risco que ameaça constantemente tragar os indivíduos cujas vidas se tornaram o foco da atenção pública”, diz o autor.
Há que se apontar também que hoje os escândalos também não são mais apenas tragédias pessoais – eles são também “lutas sociais que são travadas no campo simbólico”, no vaivém de afirmações e contra-afirmações, de revelações, alegações e negativas. E o escândalo é um fenômeno que acontece predominantemente no espaço público.
Nessa teoria social do escândalo que cria, também destaca que as transformações sociais do período pós 2a Guerra Mundial foram gradualmente enfraquecendo a política ideológica dos partidos tradicionais com base nas classes.
Para Thompson isso criou as condições para uma “política de confiança”, isto é, muitas pessoas olham cada vez mais para a credibilidade e a confiança dos líderes políticos ou aspirantes a líderes, para seu caráter (ou falta dele), como um meio de avaliar sua adequação, ou não, ao exercício de um cargo. A ideologia política e programas partidários muitas vezes são deixados de lado nesse contexto. Nisso, o escândalo político assume um novo papel poderoso e auto-reforçador, como teste de credibilidade.
Poderes ameaçados
O que está em jogo não é apenas o orgulho do acusado em um escândalo, mas também seu poder, sua capacidade de fazer uso da reputação ou bom nome a fim de exigir respeito de outros e alcançar interesses e objetivos. O caso Erenice conseguiu diminuir o poder da ministra Erenice Guerra e da candidata Dilma Rousseff. Como já mostrado, com isso a primeira perdeu o emprego e a segunda perdeu eleitorado e foi para o segundo turno das eleições, que poucas semanas antes do escândalo liderava com folga.
O autor define escândalo como “ações ou acontecimentos que implicam certos tipos de transgressões que se tornam conhecidos de outros e que são suficientemente sérios para provocar uma resposta pública”. Normalmente são três os tipos principais de escândalos em nossa sociedade, que podem se misturar: má conduta nas relações sexuais; violação de regras das transações financeiras; e a corrupção no exercício do poder político.
E são dois os modelos de escândalos definidos por Thompson. No mais simples, uma ação de transgressão oculta é revelada publicamente, ou alega-se publicamente que ocorreu, e a revelação pública e/ou as alegações provocam manifestações públicas de desaprovação. No mais complexo, como o do caso Erenice, as revelações e alegações defrontam-se com negações e contra-alegações por parte dos indivíduos envolvidos, que por sua vez levam a investigações e revelações posteriores, dando origem a uma série de transgressões de segunda ordem. Muitas vezes as transgressões de segunda ordem podem assumir importância bem maior que a ofensa original.
Após as denúncias iniciais contra Erenice, ela se defendeu com várias negações e até colocou seus sigilos à disposição para investigação. Também alegou que as denúncias eram motivadas pela eleição e atacou o candidato da oposição. Novas investigações da mídia levaram a mais denúncias, algumas que reforçavam as acusações iniciais e outras de novos casos.
A situação de Erenice ficou insustentável porque praticamente todos os veículos de mídia traziam acusações contra ela e, talvez o pior, ela estava envolvida em denúncias em conjunto com parentes. Na sociedade brasileira o político ou gestor público que usa seu poder para beneficiar sua família é muito mal visto. As denúncias de tráfico de influência e propina ficaram muito mais fortes moralmente porque envolviam parentes.
terça-feira, 21 de dezembro de 2010
quinta-feira, 16 de dezembro de 2010
DPVAT vai subir até 15%
Depois de um ano sem aumentos o preço do seguro obrigatório DPVAT no ano que vem vai subir até 15,04%. Ele é pago pelos donos de carros de passeio, táxis, motos, ônibus, micro-ônibus, caminhões e tratores.
A decisão foi do CNSP (Conselho Nacional de Seguros Privados). O seguro, que é pago junto com o IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores), para carros de passeio, por exemplo, vai passar de R$ 89,61 para R$ 96,63 e para motos, de R$ 254,16 para R$ 274,06.
Segundo o superintendente da Susep (Superintendência de Seguros Privados), órgão ligado ao Ministério da Fazenda, Paulo dos Santos, o reajuste do DPVAT está diretamente relacionado ao aumento no número de sinistros neste ano, em todas as categorias.
Fraudes/Quem administra o DPVAT, por imposição do CNSP, é a seguradora Líder-DPVAT, com sede no Rio.
Ontem por telefone, seu diretor presidente, Ricardo Xavier, confirmou que neste ano há realmente um grande aumento de sinistros.
Em 2008, foram pagos R$ 1,9 bilhão em indenizações por acidentes, invalidez ou mortes. Ano passado, foram R$ 2,244 bilhões. E neste ano, até novembro, foram 2,335 bilhões.
Ricardo afirma que hoje 60% dos sinistros são de motocicletas e explica isso devido a característica do transporte, mais exposto a acidentes, e principalmente ao grande número de fraudes. “Temos combatido muito isso, com apoio do Ministério Público e da polícia, mas mesmo assim pagamos em média mil indenizações por dia”, afirma.
O aumento do DPVAT pretende então “compensar” o que tem que se pagar a mais de indenizações neste ano. No final do ano passado a Susep fez várias mudanças na legislação que visavam minimizar fraudes, mas o efeito foi fraco. Foi criada até uma tabela para permitir o cálculo da indenização por invalidez permanente, em função da gravidade dos danos sofridos.
Muitas quadrilhas atuam apresentando atestados falsos de invalidez e óbito para receber o DPVAT, mas também há casos de pessoas que usam intermediários para contratar o DPVAT e acabam entrando em golpes. “Ter acesso ao DPVAT é fácil, não precisa usar intermediário , esse é elo de muitas fraudes”, ressalta Ricardo.
O telefone da seguradora Líder-DPVAT para dúvidas é 0800-022-12-04 e o site éwww.seguradoralider.com.br.
Valores/O seguro DPVAT (Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre ou por sua Carga a Pessoas Transportadas ou Não), é obrigatório por lei (6.194/74) e utilizado para indenizar vítimas de acidentes de trânsito causados por veículos motorizados que circulam por terra ou por asfalto.
Nos casos de morte, os herdeiros da vítima são indenizados em R$ 13,5 mil. Para invalidez, é de até R$ 13,5 mil e varia de acordo com a gravidade das sequelas. Em relação às despesas médicas, o valor reembolsado é de até R$ 2,7 mil.
Além dos valores do DPVAT é cobrado dos motoristas também a taxa de R$ 4,15 para cobrir o custo da emissão e da cobrança da apólice ou do bilhete de seguro. Além disso, há ainda a cobrança de IOF (Imposto sobre Operações Financeiras). Quem deixar de pagar o DPVAT não poderá licenciar o veículo
Distorção: motos respondem apenas por 25% das contratações no total
Praga
“A fraude existe, infelizmente, de forma endêmica no DPVAT”,
Ricardo Xavier, diretor presidente da seguradora Líder-DPVAT, empresa que administra o seguro no país
Análise
Marcos Crivelaro,
consultor de finanças pessoais
Começo de ano exige cuidados
Janeiro e fevereiro está chegando, por isso é bom se programar para muitos gastos extras como impostos (IPVA e IPTU, sobre veículos e imóveis, respectivamente), matrícula e material escolar, seguro e o DPVAT.
No começo do ano, o cobertor é curto e muitas vezes não dá para pagar tudo à vista. Deve-se avaliar bem então quando o desconto vale a pena. Muitos impostos, como o IPVA, dão descontos para quem paga à vista. O IPVA em São Paulo em 2011 dará 3% de desconto. Se você tem o dinheiro disponível, aproveite o desconto.
Na compra de material escolar, o consumidor deve escolher entre dividir a compra em várias lojas, para pesquisar e conseguir preços melhores, ou concentrar as compras em uma loja só, quando, devido ao valor maior da compra, às vezes consegue-se uma condição melhor de pagamento. Vale pedir o desconto nesses casos.
Cadernos e outros produtos de papelaria com personagens de desenhos costumam ser mais caros, então os pais precisam controlar esses gastos e ter bom senso na escolha.
quinta-feira, 9 de dezembro de 2010
Governo fará corte de gastos e deve atrasar ainda mais o PAC
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, que já foi confirmado para continuar no cargo no governo Dilma, disse ontem no seminário Diálogos Capitais 2011-2014, no Rio de Janeiro, que o governo vai apertar o cinto. “A partir de 2011, vamos reduzir, por exemplo, gastos de custeio. O estado vai fazer um ajuste, diminuir subsídios e impedir a constituição de novos gastos. Esse é o desafio que nós temos, mas não é um desafio fácil”, disse Guido.
Gastos com custeio incluem, por exemplo, salários, serviços de terceiros e material de consumo dos órgãos públicos. O volume do ajuste ainda será definido pelo Ministério do Planejamento e pela Secretaria do Tesouro Nacional. O ministro da Fazenda adiantou que o corte de gastos atingirá todos os ministérios e poderá afetar inclusive o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
A redução dos gastos públicos é uma demanda antiga do setor produtivo porque deve ajudar a redução da Selic (taxa básica de juros brasileira), mas o corte de verbas do PAC pode tornar ainda mais lento as obras infraestrutura do país.
PAC lento/Segundo a ONG Contas Abertas, que analisou o último balanço do PAC divulgado em abril, apenas 13% dos empreendimentos previstos desde 2007 estão concluídos. No estado de São Paulo o percentual é ainda menor, 11,6%.
Ontem, o presidente Lula se antecipou à sucessora, Dilma Rousseff, e anunciou que o PAC sairá da Casa Civil e ficará sob responsabilidade do Planejamento no próximo governo. A futura ministra da pasta é Miriam Belchior, atual coordenadora do PAC. Semana passada ela já sinalizou que vai fechar o cofre. “É possível fazer mais com menos e é isso que nós vamos perseguir nos próximos quatro anos”, disse ela.
O PAC prevê obras importantes para São Paulo que não começaram ou caminham lentamente, como o Ferroanel, mais um terminal de passageiros no aeroporto de Guarulhos e obras de saneamento nos municípios. (Com Agência Brasil)
Ministro prevê muitas implicações com ações
Ontem no Rio, Guido Mantega fez uma grande análise de como a redução de gastos deve ajudar vários setores no país, apesar do possível prejuízo para o PAC. “Com a redução dos gastos públicos, principalmente de custeio, vamos gerar poupança pública e abrir espaço para a redução da taxa de juros. E, ao reduzir os juros, vamos estimular o setor privado. Esse corte de gastos abre espaço considerável para a redução dos juros, até porque o Brasil ainda está muito defasado em relação ao cenário internacional e isso causa problemas, inclusive, com o câmbio”, comentou.
Análise
Amir Khair,
mestre em finanças públicas pela FGV e consultor
Dinheiro retorna para população
Uma coisa é racionalizar os gastos com despesas e outra é cortar sem critérios. O Brasil tem um déficit social muito elevado, com graves problemas na educação, segurança, habitação, saneamento, entre outras áreas. Por isso, há sim necessidade de gastos de custeio no país para melhorar os serviços públicos.
O que pode e deve ser feito é cortar despesas desnecessárias de custeio. A futura ministra Miriam Belchior precisa fazer um pente fino nos gastos.
Sobre o PAC, o governo vem empenhando muitos gastos no orçamento para esse programa, que não consegue realizar pela demora na licitações públicas no país e necessidade de licenças ambientais. Então, apesar da grande divulgação do PAC o que efetivamente é feito ainda é pouco. O que deve ocorrer no ano que vem é que a divulgação deve ser mais moderada, mas as obras já em andamento vão continuar.
A redução de gastos do governo é importante porque é um dinheiro que volta para a população na melhora de serviços públicos. Hoje no Brasil o governo se financia emitindo títulos da dívida. E como a Selic está muito alta, em 10,75% ao ano, muitos bancos e investidores internacionais compram esses títulos para faturarem com os juros. Esses juros altos são bons apenas para o mercado financeiro.
O problema é que o juro alto prejudica a indústria nacional e custo caro para o governo: o Brasil paga 5,4% do PIB com essa Selic, sendo que países emergentes pagam em média só 1,8% do PIB.
Se o governo reduzir seus gastos sobrará mais dinheiro, então ele não necessitará mais de juros tão altos. O governo Dilma vai começar com bons indicadores econômicos, como de inflação e reservas, então não pode perder a chance de fazer isso. Um controle inflacionário pela liquidez, e não pelos juros.
Gastos com custeio incluem, por exemplo, salários, serviços de terceiros e material de consumo dos órgãos públicos. O volume do ajuste ainda será definido pelo Ministério do Planejamento e pela Secretaria do Tesouro Nacional. O ministro da Fazenda adiantou que o corte de gastos atingirá todos os ministérios e poderá afetar inclusive o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
A redução dos gastos públicos é uma demanda antiga do setor produtivo porque deve ajudar a redução da Selic (taxa básica de juros brasileira), mas o corte de verbas do PAC pode tornar ainda mais lento as obras infraestrutura do país.
PAC lento/Segundo a ONG Contas Abertas, que analisou o último balanço do PAC divulgado em abril, apenas 13% dos empreendimentos previstos desde 2007 estão concluídos. No estado de São Paulo o percentual é ainda menor, 11,6%.
Ontem, o presidente Lula se antecipou à sucessora, Dilma Rousseff, e anunciou que o PAC sairá da Casa Civil e ficará sob responsabilidade do Planejamento no próximo governo. A futura ministra da pasta é Miriam Belchior, atual coordenadora do PAC. Semana passada ela já sinalizou que vai fechar o cofre. “É possível fazer mais com menos e é isso que nós vamos perseguir nos próximos quatro anos”, disse ela.
O PAC prevê obras importantes para São Paulo que não começaram ou caminham lentamente, como o Ferroanel, mais um terminal de passageiros no aeroporto de Guarulhos e obras de saneamento nos municípios. (Com Agência Brasil)
Ministro prevê muitas implicações com ações
Ontem no Rio, Guido Mantega fez uma grande análise de como a redução de gastos deve ajudar vários setores no país, apesar do possível prejuízo para o PAC. “Com a redução dos gastos públicos, principalmente de custeio, vamos gerar poupança pública e abrir espaço para a redução da taxa de juros. E, ao reduzir os juros, vamos estimular o setor privado. Esse corte de gastos abre espaço considerável para a redução dos juros, até porque o Brasil ainda está muito defasado em relação ao cenário internacional e isso causa problemas, inclusive, com o câmbio”, comentou.
Análise
Amir Khair,
mestre em finanças públicas pela FGV e consultor
Dinheiro retorna para população
Uma coisa é racionalizar os gastos com despesas e outra é cortar sem critérios. O Brasil tem um déficit social muito elevado, com graves problemas na educação, segurança, habitação, saneamento, entre outras áreas. Por isso, há sim necessidade de gastos de custeio no país para melhorar os serviços públicos.
O que pode e deve ser feito é cortar despesas desnecessárias de custeio. A futura ministra Miriam Belchior precisa fazer um pente fino nos gastos.
Sobre o PAC, o governo vem empenhando muitos gastos no orçamento para esse programa, que não consegue realizar pela demora na licitações públicas no país e necessidade de licenças ambientais. Então, apesar da grande divulgação do PAC o que efetivamente é feito ainda é pouco. O que deve ocorrer no ano que vem é que a divulgação deve ser mais moderada, mas as obras já em andamento vão continuar.
A redução de gastos do governo é importante porque é um dinheiro que volta para a população na melhora de serviços públicos. Hoje no Brasil o governo se financia emitindo títulos da dívida. E como a Selic está muito alta, em 10,75% ao ano, muitos bancos e investidores internacionais compram esses títulos para faturarem com os juros. Esses juros altos são bons apenas para o mercado financeiro.
O problema é que o juro alto prejudica a indústria nacional e custo caro para o governo: o Brasil paga 5,4% do PIB com essa Selic, sendo que países emergentes pagam em média só 1,8% do PIB.
Se o governo reduzir seus gastos sobrará mais dinheiro, então ele não necessitará mais de juros tão altos. O governo Dilma vai começar com bons indicadores econômicos, como de inflação e reservas, então não pode perder a chance de fazer isso. Um controle inflacionário pela liquidez, e não pelos juros.
segunda-feira, 6 de dezembro de 2010
Papel do Itaramaty deve crescer
A presidente eleita Dilma Rousseff ainda não anunciou oficialmente o nome de quem irá ocupar o Ministério das Relações Exteriores, mas a expectativa tanto entre diplomatas quanto na equipe de transição é a de que o escolhido seja o embaixador Antonio Patriota, que é próximo ao chanceler Celso Amorim e ocupa a segunda posição do Itamaraty, a Secretaria Geral.
O governo Dilma deve marcar o fim da chamada diplomacia presidencial, que teve início com Fernando Henrique Cardoso e, nos oito anos do governo Luiz Inácio Lula da Silva, se fez ainda mais forte e presente. Lula usou seu todo seu carisma e sua história de vida para se colocar como um dos líderes dos países em desenvolvimento.
Para a cientista política, professora da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing) e pesquisadora do Núcleo de Pesquisas em Relações Internacionais da USP (Universidade de São Paulo), Denilde Holzhacker, Dilma deve ter uma participação menor. “Ela tem um perfil diferente. Desse modo, o Itamaraty deve ter uma presença maior nas negociações internacionais”, explica.
Por outro lado, Denilde ressalta que o próximo governo sinaliza uma continuidade na política externa. O assessor internacional do governo Lula, Marco Aurélio Garcia, foi convidado a permanecer no cargo, o que indica que o PT continuará tendo influência na política externa do país.
Antonio Patriota também é defensor do fortalecimento da Unasul (União de Nações Sul-Americanas) e dos países do hemisfério sul, além de incentivar o chamado “soft power”, a construção de um poder de influência mundial com o uso de iniciativas de cooperações técnicas, propaganda positiva do país e agenda de atuação em temas sociais.
Críticas/A política externa no governo Lula recebeu críticas também sobre sua atuação e prioridades. A ainda pouca liderança na América do Sul, a intromissão na crise de Honduras, a relevância de uma candidatura no Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas), a entrada na polêmica tensão nuclear do distante Irã e a baixa prioridade para a agenda de acordos comerciais são as principais queixas.
O cientista político e economista Corival Alves do Carmo lembra que a principal ameaça ao aumento da influência brasileira na América do Sul já é a China. “A capacidade da China de gerar demanda por exportações é muito maior do que a do Brasil. Uma alternativa pode ser o pré-sal, isso se a exportação de petróleo realmente gerar recursos financeiros que permitam o país gastar mais com o exercício de liderança política regional”, comenta.
Ásia e África são apostas para ‘booms’
O mundo tem duas regiões que são consideradas estratégicas para o crescimento da economia nos próximos 30 anos: a África e o Sudeste Asiático (veja abaixo).
No continente africano, o governo brasileiro tem suas maiores apostas para o futuro, usando cooperação técnica internacional – o que o Itamaraty chama de espírito Sul-Sul, ou seja, incentivar o desenvolvimento e comércio do hemisfério sul. Segundo a ABC (Agência Brasileira de Cooperação), o Brasil tem hoje 34 acordos em vigência ou negociação na África para cooperações econômica, científica e técnica.
O doutor em relações internacionais e mestre em história social pela USP e professor do Centro Universitário Belas Artes e da ESPM, Sidney Ferreira Leite, afirma que a África tem um ambiente atual de cooperação inter-regional e intergovernamental mais propício para o desenvolvimento. “O pensamento dos governos africanos neste século mudou para assumir seus próprios problemas e o paradigma é de que, sem segurança, não há desenvolvimento”, disse.
Mas a crítica que especialistas fazem é que a ABC ainda não tem um papel de gerenciamento, de metodologia de impacto sobre os projetos brasileiros no exterior, ou seja, o próximo governo necessita estruturar uma política de doações internacionais – até para competir melhor com grandes doadores, como a China. “É urgente que participemos mais ativamente desse novo momento do continente africano. O governo Lula promoveu alguns avanços, todavia é necessário fazer muito mais”, diz Sidney.
Asean /Indonésia, Filipinas, Malásia, Singapura, Tailândia e Vietnã, as seis principais economias da Asean (Associação de Nações do Sudeste Asiático), crescerão em média 7,3% neste ano e ao ritmo de 6% entre 2011 e 2015, segundo a OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Fora a China, é a maior média de crescimento prevista por regiões.
O especialista em marketing e projetos de gestão internacional, professor da ESPM e estudioso da Ásia, Marcelo Zorovich, analisa que esses países são beneficiados por uma série de fatores: mão de obra barata (na comparação com mercados mais desenvolvidos), plataforma de exportação para muitas empresas e setores, e proximidade com China, Índia, Japão e Coreia do Sul. “Ainda se fala pouco dessa região na mídia, mas, hoje, todas as grandes empresas do mundo estão abrindo postos na Asean. Ela tem um ambiente propício para fazer negócios e as leis são rígidas para violência e tráfico de drogas”, comenta.
Em 2007, a Asean já foi o sexto mercado para as exportações brasileiras. O Itamaraty tem fomentado missões comerciais para a região de forma a estreitar o relacionamento com estes países e expandir as possibilidades comerciais, mas há críticas de que esse processo precisa ser aprofundado.
Oportunidades e Riscos
Apostas e prioridades do Brasil nos próximos anos no mundo
América do Sul
O próximo governo brasileiro sinaliza continuar apostando na integração política através da Unasul, que ainda não emplacou e com a morte de Néstor Kirchner está sem presidente.
A união aduaneira do Mercosul ainda discute o fim da tributação entre os países. Também vive o dilema da entrada ou não da Venezuela no bloco.
O Brasil não tem déficit comercial com seus vizinhos da América do Sul. Para especialistas, o que poderia ser bom na verdade deixa a liderança do Brasil em risco na região. A China já é a principal ameaça, com grandes fluxos de comércio nos países e grandes investimentos, principalmente no Peru.
Brasil tenta também terminar sua ligação bioceânica para chegar no Oceano Pacífico, mas falta dinheiro internacional para terminar obras em estradas na Bolívia e linhas ferroviárias no Brasil e Peru.
Sudeste asiático
Juntos, a Tailândia, Filipinas, Malásia, Singapura, Indonésia, Brunei, Vietnã, Mianmar, Laos e Camboja tem uma população de mais de 600 milhões de habitantes. É o bloco de países com a maior média de crescimento no mundo.
Vive de sua plataforma de exportação de serviços e tecnologia, além de ter exploração de petróleo e agricultura. É uma região estratégica no mundo que países como a China, Índia e EUA estão buscando fazer tratados de livre comércio ou aumentar seus laços.
Ásia
O maior continente da Terra, com mais de 4 bilhões de pessoas, deve ser o grande protagonista do século 21. A China é o destaque, com alto crescimento econômico, caminha para se tornar em dez anos ou menos a primeira economia do mundo. Hoje tem US$ 5 trilhões contra US$ 14 trilhões dos EUA. O Brasil tem "apenas" US$ 1,6 trilhão.
Na guerra cambial entre os países a China também é a protagonista. Quase todos os países pressionam os chineses pelo fim da política de desvalorização excessiva do yuan, que vale US$ 0,15, mas não há sinal que isso aconteça rápido.
A Índia, parceira do Brasil em alguns acordos comerciais, também é rival dos brasileiros na disputa de um assento no Conselho de Segurança da ONU e já discordou do Brasil na OMC. China e Índia, que dependem de energia importada, disputam os mesmos fornecedores no mercado internacional, dois gigantes para o Brasil enfrentar ou ser um grande fornecedor.
O Japão ainda é uma potência econômica mundial, mas vive uma estagnação que parece não ter prazo para terminar. A Coreia do Sul está em amplo crescimento, mas vive a tensão de um conflito próximo com a Coreia do Norte. A Rússia ainda tem sérios problemas econômicos e conflitos internos para resolver, mas sempre vai ser uma superpotência militar e tem uma imensa produção de petróleo e gás.
Na Ásia também estão o Afeganistão e o Paquistão, para muitos especialistas de relações internacionais verdadeiras bombas relógio. Redes terroristas atuam nesses países ainda com força e podem causar crises no mundo todo, como aconteceu no 11 de setembro.
Oriente Médio
Em princípio, seria uma região de pouco interesse para o Brasil, mas o governo Lula inseriu a região em suas prioridades. Na estratégia de tentar ser líder mundial, a diplomacia brasileira se aproximou do ditador iraniano Mahmoud Ahmadinejad, junto com a Turquia. Para muitos foi um erro, já que o regime de Teerã não respeita direitos humanos e vive uma tensão nuclear, mas o governo brasileiro defendeu sua iniciativa como uma tentativa de mediação para a chegada de acordos. Só o tempo vai dizer se a aposta foi boa ou se o Irã vai mesmo fazer um programa nuclear com fins militares. Também existe a expectativa de como Dilma Rousseff vai tratar o Irã, que ainda apedreja mulheres.
No conflito Israel-Palestina o Brasil também ofereceu uma mediação, ainda sem resultados. Israel tem um grande acordo de comércio com o Mercosul e no caso da Palestina essa região tem grande simpatia com o Brasil por causa de sua comunidade árabe. Esse caso envolve discussão de fronteiras e a criação ou não do estado palestino, então dificilmente o Brasil terá um papel de destaque nos acordos. A atuação no Oriente Médio é vista mais como para marcar presença de liderança e colher frutos comerciais da aproximação com a região.
O Brasil reconhece a OLP (Organização para a Libertação da Palestina) desde 1975 e nesta semana reconheceu a existência do estado Palestino, com as fronteiras de 4 de junho de 1967, anteriores à Guerra dos Seis Dias entre árabes e israelenses.
Europa
Vive ainda o fantasma da crise financeira e o desemprego, mas 30% do PIB do mundo está no continente e a Alemanha ainda é a quarta economia do mundo com US$ 3,3 trilhões. O Brasil depende muito da União Europeia para conseguir reformas na ONU. O G-20, ou Grupo dos 20, grupo de países emergentes, também precisa entrar em acordo com a União Europeia em muitos tratados comerciais e de agricultura.
África
Tem sérios problemas sociais e o flagelo da aids, mas já deixou de ser o "continente esquecido". A chamada África Austral, parte sul da África, banhada pelo Oceano Índico na sua costa oriental e pelo Atlântico na costa ocidental, é o destaque. Países como Angola, Moçambique e África do Sul já tem um desenvolvimento promissor.
O continente africano tem uma mão de obra gigante, com mais de um bilhão de pessoas, é visto como futuro mercado para todo o mundo e tem vastas reservas de minérios. Empresas brasileiras como a Vale e o Bradesco de olho nisso já tem atuação na África. O governo brasileiro também tem diversas cooperações técnicas com países africanos.
Mas, como sempre, a maior ameaça de influência na África é a China, que já investe bilhões de dólares nos países em obras principalmente de infraestrutura.
EUA
Ainda é a superpotência do mundo em segurança (armas, tecnologia, participação em conflitos), economia (US$ 14 trilhões de PIB) e assuntos transnacionais (meio ambiente, direitos humanos), mas os EUA convivem com problemas que podem deixar um vácuo de poder para nações como a China, Índia, Rússia, Coreia do Sul, Alemanha e até o Brasil.
A crise ainda está nos EUA com o emprego e o consumo resistindo a voltar com força. Para tentar sair da crise os EUA seguem desvalorizando o dólar. Isso é feito com pacotes para estimular a economia local, com a emissão de mais dinheiro para estimular o crédito. Porém, com mais dólar na praça seu valor cai no mundo e as exportações do resto dos países são prejudicadas.
Internamente nos EUA essas medidas de estímulo ainda não vêm motivando o consumo maior e o pior: a China por ter uma moeda superdesvalorizada artificialmente, exporta como nunca para os EUA e atrapalha sua indústria nacional. Os norte americanos reclamam da China, mas ela já é a maior possuídora de títulos da dívida dos EUA e por isso tem espaço para continuar sua política cambial.
Qualquer guerra ou ameaça terrorista no mundo os EUA também vão se envolver ou já se envolvem, então suas decisões serão sempre importantes para os rumos geopolíticos do mundo. Fora isso, em decisões importantes na ONU e na OMC o Brasil vai precisar pelo menos da simpatia dos EUA para ter êxitos.
Fontes: Especialistas entrevistados e ONU
O governo Dilma deve marcar o fim da chamada diplomacia presidencial, que teve início com Fernando Henrique Cardoso e, nos oito anos do governo Luiz Inácio Lula da Silva, se fez ainda mais forte e presente. Lula usou seu todo seu carisma e sua história de vida para se colocar como um dos líderes dos países em desenvolvimento.
Para a cientista política, professora da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing) e pesquisadora do Núcleo de Pesquisas em Relações Internacionais da USP (Universidade de São Paulo), Denilde Holzhacker, Dilma deve ter uma participação menor. “Ela tem um perfil diferente. Desse modo, o Itamaraty deve ter uma presença maior nas negociações internacionais”, explica.
Por outro lado, Denilde ressalta que o próximo governo sinaliza uma continuidade na política externa. O assessor internacional do governo Lula, Marco Aurélio Garcia, foi convidado a permanecer no cargo, o que indica que o PT continuará tendo influência na política externa do país.
Antonio Patriota também é defensor do fortalecimento da Unasul (União de Nações Sul-Americanas) e dos países do hemisfério sul, além de incentivar o chamado “soft power”, a construção de um poder de influência mundial com o uso de iniciativas de cooperações técnicas, propaganda positiva do país e agenda de atuação em temas sociais.
Críticas/A política externa no governo Lula recebeu críticas também sobre sua atuação e prioridades. A ainda pouca liderança na América do Sul, a intromissão na crise de Honduras, a relevância de uma candidatura no Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas), a entrada na polêmica tensão nuclear do distante Irã e a baixa prioridade para a agenda de acordos comerciais são as principais queixas.
O cientista político e economista Corival Alves do Carmo lembra que a principal ameaça ao aumento da influência brasileira na América do Sul já é a China. “A capacidade da China de gerar demanda por exportações é muito maior do que a do Brasil. Uma alternativa pode ser o pré-sal, isso se a exportação de petróleo realmente gerar recursos financeiros que permitam o país gastar mais com o exercício de liderança política regional”, comenta.
Ásia e África são apostas para ‘booms’
O mundo tem duas regiões que são consideradas estratégicas para o crescimento da economia nos próximos 30 anos: a África e o Sudeste Asiático (veja abaixo).
No continente africano, o governo brasileiro tem suas maiores apostas para o futuro, usando cooperação técnica internacional – o que o Itamaraty chama de espírito Sul-Sul, ou seja, incentivar o desenvolvimento e comércio do hemisfério sul. Segundo a ABC (Agência Brasileira de Cooperação), o Brasil tem hoje 34 acordos em vigência ou negociação na África para cooperações econômica, científica e técnica.
O doutor em relações internacionais e mestre em história social pela USP e professor do Centro Universitário Belas Artes e da ESPM, Sidney Ferreira Leite, afirma que a África tem um ambiente atual de cooperação inter-regional e intergovernamental mais propício para o desenvolvimento. “O pensamento dos governos africanos neste século mudou para assumir seus próprios problemas e o paradigma é de que, sem segurança, não há desenvolvimento”, disse.
Mas a crítica que especialistas fazem é que a ABC ainda não tem um papel de gerenciamento, de metodologia de impacto sobre os projetos brasileiros no exterior, ou seja, o próximo governo necessita estruturar uma política de doações internacionais – até para competir melhor com grandes doadores, como a China. “É urgente que participemos mais ativamente desse novo momento do continente africano. O governo Lula promoveu alguns avanços, todavia é necessário fazer muito mais”, diz Sidney.
Asean /Indonésia, Filipinas, Malásia, Singapura, Tailândia e Vietnã, as seis principais economias da Asean (Associação de Nações do Sudeste Asiático), crescerão em média 7,3% neste ano e ao ritmo de 6% entre 2011 e 2015, segundo a OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Fora a China, é a maior média de crescimento prevista por regiões.
O especialista em marketing e projetos de gestão internacional, professor da ESPM e estudioso da Ásia, Marcelo Zorovich, analisa que esses países são beneficiados por uma série de fatores: mão de obra barata (na comparação com mercados mais desenvolvidos), plataforma de exportação para muitas empresas e setores, e proximidade com China, Índia, Japão e Coreia do Sul. “Ainda se fala pouco dessa região na mídia, mas, hoje, todas as grandes empresas do mundo estão abrindo postos na Asean. Ela tem um ambiente propício para fazer negócios e as leis são rígidas para violência e tráfico de drogas”, comenta.
Em 2007, a Asean já foi o sexto mercado para as exportações brasileiras. O Itamaraty tem fomentado missões comerciais para a região de forma a estreitar o relacionamento com estes países e expandir as possibilidades comerciais, mas há críticas de que esse processo precisa ser aprofundado.
Oportunidades e Riscos
Apostas e prioridades do Brasil nos próximos anos no mundo
América do Sul
O próximo governo brasileiro sinaliza continuar apostando na integração política através da Unasul, que ainda não emplacou e com a morte de Néstor Kirchner está sem presidente.
A união aduaneira do Mercosul ainda discute o fim da tributação entre os países. Também vive o dilema da entrada ou não da Venezuela no bloco.
O Brasil não tem déficit comercial com seus vizinhos da América do Sul. Para especialistas, o que poderia ser bom na verdade deixa a liderança do Brasil em risco na região. A China já é a principal ameaça, com grandes fluxos de comércio nos países e grandes investimentos, principalmente no Peru.
Brasil tenta também terminar sua ligação bioceânica para chegar no Oceano Pacífico, mas falta dinheiro internacional para terminar obras em estradas na Bolívia e linhas ferroviárias no Brasil e Peru.
Sudeste asiático
Juntos, a Tailândia, Filipinas, Malásia, Singapura, Indonésia, Brunei, Vietnã, Mianmar, Laos e Camboja tem uma população de mais de 600 milhões de habitantes. É o bloco de países com a maior média de crescimento no mundo.
Vive de sua plataforma de exportação de serviços e tecnologia, além de ter exploração de petróleo e agricultura. É uma região estratégica no mundo que países como a China, Índia e EUA estão buscando fazer tratados de livre comércio ou aumentar seus laços.
Ásia
O maior continente da Terra, com mais de 4 bilhões de pessoas, deve ser o grande protagonista do século 21. A China é o destaque, com alto crescimento econômico, caminha para se tornar em dez anos ou menos a primeira economia do mundo. Hoje tem US$ 5 trilhões contra US$ 14 trilhões dos EUA. O Brasil tem "apenas" US$ 1,6 trilhão.
Na guerra cambial entre os países a China também é a protagonista. Quase todos os países pressionam os chineses pelo fim da política de desvalorização excessiva do yuan, que vale US$ 0,15, mas não há sinal que isso aconteça rápido.
A Índia, parceira do Brasil em alguns acordos comerciais, também é rival dos brasileiros na disputa de um assento no Conselho de Segurança da ONU e já discordou do Brasil na OMC. China e Índia, que dependem de energia importada, disputam os mesmos fornecedores no mercado internacional, dois gigantes para o Brasil enfrentar ou ser um grande fornecedor.
O Japão ainda é uma potência econômica mundial, mas vive uma estagnação que parece não ter prazo para terminar. A Coreia do Sul está em amplo crescimento, mas vive a tensão de um conflito próximo com a Coreia do Norte. A Rússia ainda tem sérios problemas econômicos e conflitos internos para resolver, mas sempre vai ser uma superpotência militar e tem uma imensa produção de petróleo e gás.
Na Ásia também estão o Afeganistão e o Paquistão, para muitos especialistas de relações internacionais verdadeiras bombas relógio. Redes terroristas atuam nesses países ainda com força e podem causar crises no mundo todo, como aconteceu no 11 de setembro.
Oriente Médio
Em princípio, seria uma região de pouco interesse para o Brasil, mas o governo Lula inseriu a região em suas prioridades. Na estratégia de tentar ser líder mundial, a diplomacia brasileira se aproximou do ditador iraniano Mahmoud Ahmadinejad, junto com a Turquia. Para muitos foi um erro, já que o regime de Teerã não respeita direitos humanos e vive uma tensão nuclear, mas o governo brasileiro defendeu sua iniciativa como uma tentativa de mediação para a chegada de acordos. Só o tempo vai dizer se a aposta foi boa ou se o Irã vai mesmo fazer um programa nuclear com fins militares. Também existe a expectativa de como Dilma Rousseff vai tratar o Irã, que ainda apedreja mulheres.
No conflito Israel-Palestina o Brasil também ofereceu uma mediação, ainda sem resultados. Israel tem um grande acordo de comércio com o Mercosul e no caso da Palestina essa região tem grande simpatia com o Brasil por causa de sua comunidade árabe. Esse caso envolve discussão de fronteiras e a criação ou não do estado palestino, então dificilmente o Brasil terá um papel de destaque nos acordos. A atuação no Oriente Médio é vista mais como para marcar presença de liderança e colher frutos comerciais da aproximação com a região.
O Brasil reconhece a OLP (Organização para a Libertação da Palestina) desde 1975 e nesta semana reconheceu a existência do estado Palestino, com as fronteiras de 4 de junho de 1967, anteriores à Guerra dos Seis Dias entre árabes e israelenses.
Europa
Vive ainda o fantasma da crise financeira e o desemprego, mas 30% do PIB do mundo está no continente e a Alemanha ainda é a quarta economia do mundo com US$ 3,3 trilhões. O Brasil depende muito da União Europeia para conseguir reformas na ONU. O G-20, ou Grupo dos 20, grupo de países emergentes, também precisa entrar em acordo com a União Europeia em muitos tratados comerciais e de agricultura.
África
Tem sérios problemas sociais e o flagelo da aids, mas já deixou de ser o "continente esquecido". A chamada África Austral, parte sul da África, banhada pelo Oceano Índico na sua costa oriental e pelo Atlântico na costa ocidental, é o destaque. Países como Angola, Moçambique e África do Sul já tem um desenvolvimento promissor.
O continente africano tem uma mão de obra gigante, com mais de um bilhão de pessoas, é visto como futuro mercado para todo o mundo e tem vastas reservas de minérios. Empresas brasileiras como a Vale e o Bradesco de olho nisso já tem atuação na África. O governo brasileiro também tem diversas cooperações técnicas com países africanos.
Mas, como sempre, a maior ameaça de influência na África é a China, que já investe bilhões de dólares nos países em obras principalmente de infraestrutura.
EUA
Ainda é a superpotência do mundo em segurança (armas, tecnologia, participação em conflitos), economia (US$ 14 trilhões de PIB) e assuntos transnacionais (meio ambiente, direitos humanos), mas os EUA convivem com problemas que podem deixar um vácuo de poder para nações como a China, Índia, Rússia, Coreia do Sul, Alemanha e até o Brasil.
A crise ainda está nos EUA com o emprego e o consumo resistindo a voltar com força. Para tentar sair da crise os EUA seguem desvalorizando o dólar. Isso é feito com pacotes para estimular a economia local, com a emissão de mais dinheiro para estimular o crédito. Porém, com mais dólar na praça seu valor cai no mundo e as exportações do resto dos países são prejudicadas.
Internamente nos EUA essas medidas de estímulo ainda não vêm motivando o consumo maior e o pior: a China por ter uma moeda superdesvalorizada artificialmente, exporta como nunca para os EUA e atrapalha sua indústria nacional. Os norte americanos reclamam da China, mas ela já é a maior possuídora de títulos da dívida dos EUA e por isso tem espaço para continuar sua política cambial.
Qualquer guerra ou ameaça terrorista no mundo os EUA também vão se envolver ou já se envolvem, então suas decisões serão sempre importantes para os rumos geopolíticos do mundo. Fora isso, em decisões importantes na ONU e na OMC o Brasil vai precisar pelo menos da simpatia dos EUA para ter êxitos.
Fontes: Especialistas entrevistados e ONU
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